• Este aparelho promete livrar o usuário de dor crônica na cabeça e nas costas

    Bira Maciel e Diogo Jardim, os fundadores da neuroUP
    Jose Renato Junior | 14 out 2020

    Se alguém dissesse a você que desenvolveu um aparelho que possibilita treinar seu cérebro para que, assim, você tenha melhor controle das funções de seu corpo, você acreditaria? Pois pode acreditar: é isso que faz a startup neuroUP, que tem como foco a criação de produtos que auxiliam no tratamento de doenças crônicas e relaxamento.

    A solução desenvolvida pelos empreendedores recifenses Ubirakitan Maciel, o Bira, e Diogo Jardim é uma inédita plataforma portátil de biofeedback que ajuda no tratamento de dores crônicas e tem como missão tornar a neurotecnologia acessível à população em geral – e isso a baixo custo.

    Mas o que é exatamente biofeedback? “É uma técnica de autorregulação cerebral”, explica Bira.

    “A ideia do feedback é ensinar a pessoa a ter controle sobre o próprio corpo. É difícil tentar controlar e modificar, por conta própria, algum padrão de contração muscular, pensamento ou ritmo de ansiedade – é preciso entender o que está acontecendo com o organismo”, diz.

    “Imagina se eu peço a você para tentar relaxar seu braço, por exemplo. Como você relaxa sem ter informação? Você não sabe se está fazendo certo, se está fazendo errado”, explica.

    O biofeedback atua como um sensor que capta informações do corpo e transforma esses dados em informações visuais. Essas podem ser acessadas em um aparelho, tornando possível ver a própria contração de musculatura em tempo real.

    “Daí o nome biofeedback: você recebe feedback da sua biologia em tempo real. Com isso, consegue aumentar as suas capacidades, treinando seu cérebro para ter controle e para melhorar as funções do corpo.”

    CONTROLAR CONTRAÇÕES MUSCULARES VIRA UM GAME

    Diogo Jardim, que cofundou a startup e hoje atua como CTO, explica que o equipamento capta a informação com eletrodos adesivos, que fazem a leitura dos sinais do corpo.

    “Pessoas que têm excesso de contração muscular – como tensão ou dor crônica – conseguem detectar as informações da cabeça, do pescoço, do ombro, de qualquer região que queiram trabalhar, e ver tudo na tela do celular”, diz.

    Esse sinal do biofeedback é captado e enviado por bluetooth e, por meio de algoritmos, o celular processa a informação e exibe esses dados para o usuário com o uso de gamificação.

    “É como se um paciente jogasse um jogo pela própria contração do músculo. Então ele pode ser usado tanto para ensinar a pessoa a relaxar – alguém que está tenso e precisa aprender a ter controle sobre isso –, ou o contrário, para ensinar a pessoa a se exercitar para aumentar a força em algum músculo”, completa Diogo.

    Ao terminar a sessão, o sistema gera um relatório automaticamente com o nome da pessoa e os dados principais. É possível, assim, realizar um acompanhamento de força mínima, máxima e a evolução com o passar dos dias – o que serve como um estímulo para que os usuários continuem utilizando o biofeedback.

    Para facilitar a utilização da tecnologia, a neuroUP também realiza treinamentos com profissionais que adquirem a ferramenta – e em breve deverá lançar um curso online para profissionais.

    “Nosso site tem bastante material educativo: postagens, e-book, textos. Nós oferecemos um treinamento, que é incluso para todo profissional, e temos um suporte que vai estar sempre à disposição para tirar dúvidas, para fazer o acompanhamento. Mas de fato é uma técnica bem simples e as pessoas conseguem aprender com duas horinhas de treinamento ou menos”, pondera.

    Amigos desde o ensino médio, Diogo e Bira desenvolveram tecnologia própria para o aparelho

    DOIS UNIVERSITÁRIOS E A CRIAÇÃO DA NEUROUP

    A ideia do biofeedback veio na época faculdade. Diogo e Bira, que se conheceram em 2007 em Recife, na época do terceiro ano do ensino médio, escolheram dois cursos diferente, mas com coisas em comum: Bira fez fisioterapia e Diogo, engenharia biomédica.

    Na faculdade, ambos começaram a realizar pesquisa em laboratórios e tiveram a oportunidade de fazer intercâmbios na Europa. Foi aí que descobriram uma série de tecnologias inovadoras – mas que não chegavam até os consumidores finais. Os equipamentos, nos quais conduziam os estudos, eram caros, muito difíceis de trabalhar e ótimos para o cenário acadêmico, mas péssimos para o uso no dia a dia .

    “E por que não desenvolver tecnologia própria, nacional, e não depender de importar, de trazer equipamentos muito caros de fora do Brasil?”, questiona Bira.

    “Fora do Brasil, essas técnicas já são bem conhecidas. Na Europa e nos Estados Unidos, os instrumentos são acessíveis: as pessoas compram pela internet e eles chegam para elas próprias usarem. O nível de maturidade é um pouco maior. Aqui no Brasil faltava isso, então foi aí que surgiu a ideia de montar a empresa”, finaliza.

    Em 2013 os dois começaram esquematizar as possibilidades da empresa e, no fim do ano seguinte, nasceu a neuroUP – com uma ajuda do Start-Up Brasil, iniciativa do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, que auxiliou o negócio a crescer e progredir.

    A neuroUP também participou do programa de aceleração no Cesar Labs, o primeiro investidor de Bira e Diogo. O investimento-semente foi realizado na época da aceleração junto com dois investidores anjos que, na época, fizeram o coinvestimento.

    Até 2019, a neuroUP recebeu vários fomentos de agências e outros programas – da Samsung à Facepe (Fundação de Amparo à Ciência e Tecnologia do Estado de Pernambuco). Outras rodadas de investimento aconteceram com dois investidores: os irmãos Ítalo e Yves Nogueira, que até hoje fazem parte do conselho da empresa. Ano passado, porém, chegou o maior aporte da startup: R$ 2,5 milhões, provindos do fundo Criatec 3, investidos pela KPTL, uma das principais gestoras de venture capital do país.

    Foi com essa entrada de capital que a empresa tornou-se uma S.A. “A gente continua sendo uma startup, a empresa é pequena, são 14 pessoas no total”, diz Bira.

    “Ainda tem a estrutura e toda essa parte dinâmica, de ser ágil, de uma startup, mas este momento é de estruturação, de governança, de organização, de funções. Então é um momento em que a gente está realmente expandindo, separando um pouquinho mais as funções, porque no início cada pessoa faz tudo, né?”

    OS NEGÓCIOS DA NEUROUP E A PANDEMIA

    O foco do trabalho da neuroUP está no público B2B – até porque a ferramenta é poderosíssima para fisioterapeutas e personal trainers –, mas o vírus Sars-Cov-2 obrigou a empresa a mudar um pouco os planos.

    “Iniciamos na pandemia um trabalho B2C, para as pessoas que, em casa, querem fazer o treinamento”, afirma Bita.

    “Acaba que as academias ainda não são o público principal – ainda que, em breve, planejemos lançar uma ferramenta que irá monitorar, ao mesmo tempo, vários músculos e possibilitar entender se um exercício está sendo feito de forma simétrica”, revela Bira.

    “Mas hoje o foco principal tem sido no relaxamento, as pessoas que querem aprender a relaxar e as que querem aprender a fazer exercícios quando o nível de contração está bem baixo. Essa linha esportiva, de prática de exercícios, é uma excelente oportunidade, já temos bastante procura também”, completa.

    Os clientes B2B da neuroUP somam por volta de 170 no Brasil, além de outros espalhados pela América Latina. A pandemia trouxe, no entanto, um impacto para o caixa da neuroUP.

    “Nosso principal cliente fechou as portas. Todos os clientes fecharam durante essa época, no início”, pondera Diogo. “Foi um baque porque no ano passado estávamos em um caminho bem legal. Era uma rota de crescimento. Mas 2020 foi um momento em que precisamos parar um pouco, pensar.”

    O cofundador acredita que essa pausa teve seu lado positivo: a startup conseguiu reavaliar muito do que estava acontecendo. “Foi possível conversar com muitos clientes, validar bastante coisa e começar a planejar essa linha de exercícios físicos”, diz.

    “Então no início foi dar uns dois passos para trás, talvez uns dez para trás, e sentir o impacto da parte financeira. Mas agora, no segundo semestre, as coisas já estão voltando realmente em um ritmo legal, melhor até do que no ano passado.”

    A neuroUP não precisou reduzir ninguém da equipe – o número de funcionários até cresceu. As metas, porém, foram refeitas. Se inicialmente eles desejavam atender 400 novos clientes em 2020, esse número precisou cair para 100.

    Já em termos de faturamento, o plano é de ficar próximo de R$ 250 mil até o final de 2020, mas ampliar a meta para próximo de R$ 2 milhões em 2021. Parece um salto alto, mas os empreendedores acreditam na revolução tecnológica provocada pela neuroUP. Sem dor de cabeça.

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