• Como a Roche planeja oferecer até cinco vezes mais inovação em saúde com metade do custo para a sociedade

    Marcelo Oliveira, head de Medicina Personalizada na Roche Brasil
    Marcelo Oliveira, head de Medicina Personalizada na Roche Brasil. (Foto: Divulgação)
    Jose Renato Junior | 27 jul 2022

    Há pelo menos seis anos, a Roche elencou globalmente a área de Medicina Personalizada como alvo de grande interesse. Em 2019, o administrador baiano Marcelo Oliveira, 44, voltou à empresa onde começou como estagiário, após um hiato de 10 anos, agora como Head de Medicina Personalizada na Roche Brasil, simbolizando esse novo posicionamento.

    Apaixonado pelo potencial da área e pelos resultados já obtidos, Marcelo explica que a medicina personalizada abrange quatro frentes – diagnóstico de precisão, tratamentos, captação e análise dos dados da jornada do paciente e geração de insights para o desenvolvimento de novas soluções (medicamentosas, de diagnóstico ou de produtos digitais) – e não se concentra apenas em uma especialidade médica. 

    “Se você desenvolve soluções, provê para médicos e para todo o sistema de saúde uma melhor decisão terapêutica e sustentabilidade”, diz.

    Esse entendimento transformou a forma de operar da empresa em relação ao tema, porque tomar decisões de tratamento centradas no paciente e fornecer cuidados médicos personalizados implicava em ampliar o escopo das soluções oferecidas para além de medicamentos.

    Em 2016, a Roche começou a se movimentar na área da oncologia ao iniciar a aquisição da Foundation Medicine, marca de testes genômicos que analisa mais de 300 genes para ajudar a combinar os pacientes com as opções de tratamento mais apropriadas para eles. A operação foi concluída em 2018.

    No ano seguinte, os anteriormente chamados representantes de campo evoluíram para os atuais Patient Journey Partners e Health System Partners (parceiros de jornada dos pacientes e parceiros do sistema de saúde, em tradução livre, respectivamente), profissionais que constroem soluções em conjunto com clínicas, médicos, hospitais e governos.

    Em 2019, aconteceu a compra da healthtech Flatiron Health, dedicada ao mapeamento das informações de jornada do paciente oncológico em prontuários eletrônicos, realizando a extração, a curadoria e a publicação de dados reais. Ela traduz as experiências dos pacientes em evidências do mundo real para melhorar o tratamento, informar as políticas e avançar na pesquisa.

    Empolgado com o que está por vir, Marcelo Oliveira conversou com FUTURE HEALTH sobre a meta da Roche de trazer até cinco vezes mais inovação ao mercado com metade do custo para a sociedade – o que implica em aumentar investimentos em pesquisa e desenvolvimento em medicina personalizada (só no Brasil, em 2021, foram R$ 9 milhões).

    FUTURE HEALTH: Como você – um cara que estudou administração, fez MBA em marketing, programa executivo de finanças – veio trabalhar no mercado de saúde? Sempre foi uma área que lhe atraiu? Por quê?

    MARCELO OLIVEIRA: Ainda na faculdade, entrei na Roche como estagiário de campo, aquela pessoa que visitava os médicos – estou na minha segunda passagem pela empresa. 

    Aqui na Roche pude ver uma empresa diferente do que o senso comum imagina – é uma indústria extremamente comprometida com a saúde das pessoas. Obviamente, é um mercado que desenvolve produtos para saúde e têm o objetivo de tê-los disponíveis ao redor do mundo. E isso é construído com investimento em conhecimento, técnica de levantamento de informações e muita pesquisa. 

    O que me encanta é saber que, no final do dia, você trabalha com algo que modifica diretamente a vida das pessoas de uma maneira positiva… é um super privilégio. 

    Nos últimos 20 anos, a indústria evoluiu muito, principalmente em relação a olhar de maneira mais ampla o que os clientes precisam. Medicina personalizada é uma área dentro da empresa que não está comprometida diretamente com o resultado de vendas, mas com construir uma estrutura que faça as soluções chegarem até os pacientes.

    FH: Quando você voltou à empresa, em 2019, essa visão sobre a medicina personalizada já estava estabelecida

    MO: Eu voltei por causa disso! Essa estratégia já existe na Roche desde 2016. Acredito muito que este é o futuro da saúde – já tem muitas aplicações presentes, mas é o futuro.

    Estamos também saindo de um modelo que, tradicionalmente, tinha pessoas de campo muito voltadas à venda para um modelo em que eles estão focados em construir parcerias e projetos que sejam de valor para a jornada dos pacientes e para as instituições. 

    Acredito que estamos criando, com isso, uma nova forma de atuar no mercado. Hoje, trabalhamos com as instituições de saúde com foco em como podemos melhorar as jornadas dos pacientes que elas tratam. Naturalmente, isso faz com que elas se apropriem de nossas tecnologias. Criar essa sinergia transforma as práticas de cuidado e leva à sustentabilidade e eficiência do sistema. 

    FH: Você se refere a algo semelhante à parceria da Roche Brasil com a Clínica AMO

    Exato. Esse projeto consiste em acessarmos, junto com a AMO, os dados da jornada de pacientes com câncer de pulmão buscando ineficiências no sistema. O que são ineficiências no sistema? Eventuais utilizações não completamente adequadas de um teste ou de uma terapia. Estamos gerando uma solução automatizada com essa clínica para que essas ineficiências sejam sanadas.

    Perceba que em nenhum momento mencionei vender remédios ou testes. Trata-se de construir uma solução que fará com que aquela clínica trate melhor o paciente, com mais resultados e, principalmente, com melhor uso do recurso – vindo, em geral, de operadoras de planos de saúde, porque essa é uma clínica privada.

    FH: Como vocês avaliam essas ineficiências? É com alguma plataforma tecnológica ou são os patient journey partners?

    MO: Os patient journey partners conduzem o processo em conjunto com outros profissionais internos, mais especialistas. Eles trabalham dentro da clínica para buscar essas ineficiências. Uma solução automatizada nos permite comparar como um paciente é tratado em condições normais e em condições otimizadas.

    Vou dar um exemplo real: imagine uma pessoa diagnosticada com câncer de pulmão em estágio de metástase. Em condições normais, ela vai começar o tratamento com uma quimioterapia. Isto é o padrão. A única certeza no início de um tratamento quimioterápico para alguém com uma doença metastática é que, em algum momento, o tratamento vai parar de funcionar.

    Ele funciona no início, mas depois para de funcionar. Então, após o primeiro tratamento falhar, a pessoa começa a segunda linha de tratamento quimioterápico. Em geral, essa abordagem vai falhar novamente. Vamos imaginar, então, uma terceira fase em que a pessoa finalmente tem acesso a um teste genômico da Foundation Medicine – com sequenciamento de DNA que identifica biomarcadores relacionados ao tumor.

    Quando essa pessoa tem acesso ao teste, descobre uma mutação genética para a qual já existe um tratamento direcionado que ela poderia ter tomado duas fases antes. Isto é uma clara ineficiência do sistema.

    Neste exemplo, então, a pessoa passou por um período de tempo em que não teve o melhor tratamento e não houve o melhor uso do recurso – e ninguém estava fazendo nada errado! Todos esses tratamentos são aprovados, é condição clínica, é protocolo. O que a gente está falando aqui é de melhorar o que já é positivo.

    Agora, imagine que outra pessoa com caso similar tenha acesso, desde o início, a um teste genômico como esse. Quando isso acontecer, ela já vai iniciar o tratamento pela terapia direcionada, sem passar pelas fases de quimioterapia, inclusive poupando recursos do sistema. 

    Este é um exemplo bem prático do que estamos construindo. Encontramos jornadas de pacientes e falamos: “Será que aqui não cabia ter feito um teste ou um outro tipo de tratamento e de acompanhamento?” Enfim, há várias possibilidades de abordagem para melhorar e se melhoramos, usamos os recursos de maneira mais adequada.

    FH: Vocês usam o recurso que está disponível dentro da Roche – seja ele o teste Foundation Medicine, a comparação com os dados que vêm da Flatiron… tudo que for possível dentro daquele projeto específico. É isso?

    MO: Exatamente. E além de usarmos as nossas tecnologias, usamos tecnologias e recursos que as próprias instituições têm e que podem também ser de outras empresas de saúde. 

    Isso porque não acreditamos que a medicina personalizada é algo que se faz sozinho. A Roche é um dos atores desse sistema. 

    Um ator que se dedica, investe bastante e reúne quatro frentes de trabalho – diagnóstico pela Roche Diagnóstica; tratamentos pela Roche Farmacêutica; testes genômicos pela Foundation Medicine e Roche Testing e captura de dados por meio da Flatiron.

    Mas existem outras empresas de saúde que junto conosco podem também construir essa transformação. Acreditamos bastante em fazer parcerias com atores de saúde. E pra dar mais um exemplo, temos, desde 2019, um projeto chamado Lung Mapping em parceria com seis competidores nossos – AstraZeneca, Bayer, Bristol Myers Squibb, Pfizer, Novartis e Takeda – para que, no Brasil, pacientes com câncer de pulmão de um tipo específico chamado adenocarcinoma tenham acesso gratuito ao teste Foundation Medicine.

    Isso começou porque cinco empresas farmacêuticas – AstraZeneca, Bayer, Bristol Myers Squibb, Pfizer e Roche – decidiram se reunir e oferecer esses testes pros pacientes. É algo muito diferente do normal.

    FH: O surgimento dos patient journey partners foi uma inovação do antigo modelo de representantes de campo? É uma forma de superar a resistência e desconhecimento sobre medicina personalizada?

    MO: Sim, é uma evolução da nossa forma de trabalho. De fato, não temos mais os representantes tradicionais, mas não consideramos que eles foram substituídos pelos patient journey partners – focados em hospitais, clínicas, médicos – e health system partners – focados em entidades de classe, sociedades médicas, operadoras de saúde e governos –, porque é um novo modelo de trabalho na Roche inteira.

    O princípio é baseado na construção de parcerias e projetos focados em: eficiência e melhorias para o sistema de saúde; como atender melhor os pacientes; e como conquistar mais resultados pros pacientes. 

    A Roche trabalha no campo desta forma. É uma transformação completa. Mudamos não somente os cargos de representante. Vários outros que tinham interação no campo também são diferentes hoje, porque a empresa inteira se preparou para trabalhar dessa forma, que é diferente de como outras empresas têm trabalhado. 

    Usamos o modelo Agile, que privilegia a horizontalização e fluidez entre colaboradores de diversas áreas da empresa. Nele, as pessoas contribuem com suas expertises, mas não restritas a seus, digamos, departamentos. Nos orgulhamos muito disso.

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