• “É inegável que pessoas de famílias longevas tendem a viver mais”, afirma gerontologista

    Otávio Tolêdo Nóbrega, da SBGG-DF.
    Otávio Tolêdo Nóbrega é presidente do Departamento de Gerontologia da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia do Distrito Federal (SBGG-DF).
    Jose Renato Junior | 11 ago 2023

    O envelhecimento é uma das questões mais complexas das ciências biológicas, podendo ser entendido como uma deterioração gradual do corpo que se torna mais perceptível ao final do período fértil/reprodutivo da vida. 

    O componente genético da longevidade em humanos vem sendo analisado há décadas, e começou com a comparação da idade da morte de gêmeos monozigóticos e dizigóticos. 

    Essa observação permitiu estimar em 25% a variação na longevidade humana devido a fatores herdáveis. 

    Além disso, pesquisas indicam que esse componente é maior em idades mais avançadas, e mais importante em homens que em mulheres [1, 2]

    Antes destes achados, Jarvik et al. [3] havia mostrado que gêmeos monozigóticos que chegaram a ter 60 anos ou mais de idade foram mais concordantes em termos de tempo total de vida atingida do que os gêmeos dizigóticos. 

    Estamos falando do fenômeno da herdabilidade dos fenótipos complexos, onde parcela da variabilidade natural de uma característica pode ser explicada ou creditada à herança. 

    A literatura médica apresenta diversos exemplos de traços humanos com alta herdabilidade, como transtornos do espectro autista (> 90%); esquizofrenia (> 80%); e doença de Alzheimer (≈ 60%).

    A longevidade humana não tem uma herdabilidade tão alta, pois varia de 15 a 40% a depender do estudo. 

    Ainda assim, é inegável que pessoas pertencentes a famílias que vivem bastante tendem a ter tempo total de vida maior que a média da população.

    Uma meta-análise recente com foco sobre SNPs (do inglês single nucleotide polymorphism), que representam a forma mais comum de variação genética entre indivíduos, verificou que portar variantes específicas (alelos) de cinco genes conhecidos produzia uma longevidade excepcional.

    Chama atenção que o efeito individual de cada um destes genes tenha sido modesto (ou mesmo desprezível), permitindo sugerir que, apenas quando estas variantes alélicas são herdadas simultaneamente, tem-se uma contribuição mensurável da genética sobre a longevidade [5], o que, convenhamos, é raro acontecer.

    Mas não se desespere. Existem boas notícias para os nascidos em famílias não tão longevas. Afinal, há vários outros fatores além da genética que contribuem para a longevidade. 

    Além disso, a literatura também demonstra que o estilo de vida pode até mesmo neutralizar uma carga genética desfavorável.

    Estamos neste caso falando da epigenética, ou seja, da possibilidade de que o funcionamento da carga genética do indivíduo seja otimizado com base no que ele come, pelos exercícios que pratica e pelo sono do qual desfruta, dentre outros comportamentos. 

    Trata-se de uma área do conhecimento ainda em desenvolvimento, mas que promete, para um futuro próximo, o desenvolvimento de exames sanguíneos acessíveis que possibilitem medir a “idade biológica” do indivíduo [6], por exemplo. 

    Atualmente, não há estudos clínicos que apontem benefícios inequívocos para a longevidade humana vindos da modulação epigenética por medicamentos. 

    Mas a quantidade de estudos clínicos na área é grande [7], e a busca por um fármaco que potencialize os efeitos de um estilo de vida saudável é intensa, com ênfase para ativadores de sirtuínas e para os moduladores de metilases e acetilases, mas cujos testes clínicos ainda são inconclusivos.

    Otávio Tolêdo Nóbrega é presidente do Departamento de Gerontologia da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia do Distrito Federal (SBGG-DF).

    Referências

    (1) vB Hjelmborg J, et al. Genetic influence on human lifespan and longevity. Hum Genet 2006; 119(3): 312–21;

    (2) Herskind AM, et al. The heritability of human longevity: a population-based study of 2872 Danish twin pairs born 1870–1900. Hum Genet 1996; 97(3): 319–323;

    (3) Jarvik LF, et al. Survival trends in a senescent twin population. Am J Hum Genet 1960; 12: 170-9;

    (4) Hayflick L. The future of ageing. Nature 2000; 408(6809): 267-9;

    (5) Revelas M, et al. Review and meta-analysis of genetic polymorphisms associated with exceptional humanlongevity. Mech Ageing Dev 2018; 175: 24-34;

    (6) Hovarth S. DNA methylation age of human tissues and cell types. Genome Biology (2013), 14: 3156;

    (7) Wang, et al. Epigenetic regulation of aging: implications for interventions of aging and diseases. Signal Transduction and Targeted Therapy (2022) 7:374.

    Confira Também: