• Novo composto inibe microrganismos resistentes a medicamentos

    Cristina Paiva de Sousa, bióloga da UFSCar
    Cristina Paiva de Sousa é coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Biotecnologia (PPGBiotec) da UFSCar. (Foto: CCS/UFSCar)
    Jose Renato Junior | 5 ago 2022

    Todos os anos, cerca de 700 mil pessoas morrem no mundo em decorrência de infecções resistentes aos antimicrobianos (antibióticos, antifúngicos, antivirais, antimaláricos e anti-helmínticos), de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS). 

    Até 2050, o problema, que acontece quando bactérias, fungos, vírus e parasitas sofrem mutações e deixam de responder aos medicamentos, poderá se tornar a principal causa de óbitos globais, atingindo 10 milhões de pacientes.

    Em um cenário como este, a busca por soluções e tratamentos mais eficazes se faz extremamente urgente e necessária – o que estimula a bioprospecção e a síntese de novas substâncias com propriedades farmacológicas.

    No Brasil, por exemplo, pesquisadores da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) desenvolveram um composto que se mostrou eficiente no combate a alguns patógenos e é inédito para este tipo de uso. 

    Os melhores resultados foram com as bactérias Staphylococcus aureus, que têm cepas resistentes e são causadoras de diversas doenças de pele, além de terem ligação com infecções relacionadas à assistência à saúde, as chamadas IRAS – condição que pode ser adquirida após procedimentos assistenciais e internações.

    Também foram observados efeitos positivos contra a bactéria Escherichia coli, potencialmente ocasionadora de enfermidades gastrointestinais e urinárias, dentre outras patologias.

    Cristina Paiva de Sousa, professora no Departamento de Morfologia e Patologia (DMP) e coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Biotecnologia (PPGBiotec), ambos da UFSCar, e uma das idealizadoras do trabalho, comenta:

    “Sabemos que há uma crescente resistência dos microrganismos, principalmente diante do uso indiscriminado de antimicrobianos, então, nos propusemos a desenvolver um produto que pudesse ser usado para minimizar essa situação.”

    Longa jornada

    O projeto foi iniciado há mais de 5 anos e envolveu o uso dos compostos orgânicos bases de Schiff N,N’-bis(Salicylidene)-1,2-phenylenediamine – também chamados de Salofen – complexados com íons de Cobre II e Cobalto II.

    “As bases de Schiff, ao interagirem com metais, têm potencial antimicrobiano, com interessantes propriedades físicas, químicas e biológicas. Isto possibilita uma vasta gama de aplicações biotecnológicas e industriais, inclusive para potencializar a inibição de doenças”, explica Cristina.

    Para a realização do trabalho, a equipe – formada também por Bianca Soriano, doutora pelo PPGBiotec; Genoveva Flores Luna, doutora em Biotecnologia pela UFSCar, e Thiago Andrade de Toledo, pesquisador de pós-doutorado na UFMT – utilizou cepas catalogadas de Staphylococcus aureus, Escherichia coli e Candida albicans da American Type Culture Collection (ATCC), organização americana que coleta, armazena e distribui materiais para pesquisa e desenvolvimento.

    Inicialmente, os pesquisadores avaliaram o poder antimicrobiano das bases de Schiff complexadas aos íons metálicos. Essa etapa envolveu estudos das propriedades de cada substância, testes de microbiologia, definição de temperatura adequada e quantidade específica dos elementos, dentre outros processos. 

    Na sequência, foram feitos testes de citotoxicidade a fim de verificar se o composto não oferecia riscos ao corpo humano. Cristina explica que a equipe utilizou o fibroblasto (célula da pele) na linguagem Hfr-1, com resultados positivos. 

    “Após todas as análises, podemos afirmar que o nosso produto consegue não apenas diminuir o metabolismo das bactérias, mas também matá-las, e isso sem interferir no nosso organismo, o que o torna útil para tratar doenças de pele, como piodermite, impetigo bolhoso e abscessos.”

    Todos os experimentos foram feitos em escala laboratorial, e a tecnologia, já patenteada junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), com o apoio da Agência de Inovação da UFSCar, está disponível para comercialização. Porém, para que possa efetivamente chegar ao mercado, é preciso atrair investimentos da indústria de biotecnologia ou de companhias farmacêuticas.

    A partir daí, os pesquisadores identificarão a melhor forma de administração – se via gotas, spray, pó, pomada ou cápsulas – e, caso seja necessário, poderão realizar testes em humanos. 

    A líder do projeto completa:

    “A atividade bactericida e a ausência de citotoxicidade para o nosso organismo estão comprovadas, mas, agora, necessitamos de apoio para que o invento transponha os muros da universidade e chegue até quem realmente precisa.”

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