Qual a idade para parar de empreender e sossegar na aposentadoria? Nenhuma, se você mantém o ímpeto de criar projetos e se adaptar a novas tecnologias para se manter atualizado e competitivo.
Um caso desses de empreendedorismo sênior é o do paulista José Maria Alves de Almeida Prado, que aos 71 anos lançou o DrApp, uma plataforma que permite acesso a consultas médicas e exames com uma redução de preços de até 80% para o usuário.
Através do cadastramento de profissionais de medicina e parcerias com laboratórios, o DrApp por enquanto abrange apenas São Paulo. O forte da plataforma em seu início é a associação a entidades de classe – como as seções paulistas da Ordem dos Advogados do Brasil e do Conselho Regional de Corretores de Imóveis, além da Associação Paulista de Medicina, entre outras –, que viabilizam o acesso para seus funcionários, familiares, dependentes diretos e agregados.
Uma pessoa que não pertence a uma dessas entidades e quer utilizar o DrApp como indivíduo apenas precisará pagar uma taxa de R$ 15 mais 5,26% do valor cobrado pela consulta.
A estimativa é que a plataforma agregue 6,9 milhões de pacientes potenciais que podem procurar ajuda médica por meio dela e pagar bem menos por isso.
O valor-base de uma consulta presencial com um médico cadastrado no DrApp é de R$ 104,64 – 84% dos profissionais cobram isso ou, às vezes, até menos. Para teleconsultas, o valor da maioria dos atendimentos fica entre R$ 70 e R$ 104,64.
José Maria considera a iniciativa mais necessária ainda atualmente. “Os planos de saúde perderam 4 milhões de usuários nos últimos anos. Só nos primeiros meses de pandemia foram 300 mil”, diz ele.
“O desemprego pegou feio e 70% dos planos de saúde são para empresas. O SUS é ótimo, acho que é o futuro do negócio, mas tem muita fila para consultas e exames. Se a pessoa tiver um serviço particular a valor acessível, vai poder se cuidar.”
INVESTIMENTO PRÓPRIO DE R$ 3 MILHÕES
Desenvolvido desde 2018, o DrApp consumiu de José Maria um investimento próprio de R$ 3 milhões e é seu grande projeto atual numa longa e variada trajetória.
Natural de Jaú, no interior de São Paulo, desenvolto e bom papo, ele criou uma ampla rede de contatos e relações desde que se mudou para a capital paulista em 1967 acompanhando o pai.
“Meus amigos já estão quase todos aposentados. Eu ainda estou correndo atrás da bola. Sempre fui uma pessoa voltada para o trabalho. O pessoal fala que sou meio louco, meio Steve Jobs”, diverte-se.
Quieto ele nunca ficou. Começou como office-boy de banco, virou contato publicitário após servir no Exército, teve uma breve passagem de um ano por Santa Catarina para atuar como superintendente de uma empresa de pesca e estaleiro, trabalhou numa indústria de laticínios, foi corretor de imóveis e sócio de agência de propaganda.
Sua primeira entrada no mundo da tecnologia foi para ajudar um primo a desenvolver um recarregador de fita para impressoras de computador. Em tempos em que a informática ainda engatinhava no Brasil, uma fita nova custava caro e era interessante para as empresas fazer essa recarga, por isso a máquina deu bons resultados.
José Maria acabou comprando metade da empresa, que se transformou na APF Informática em 1984, e ainda segue em atividade.
A AFP cresceu desenvolvendo produtos com foco na ergonomia, como suportes para computadores e impressoras, extensores de cabos de rede e braços metálicos que permitiam a movimentação dos enormes monitores de tela e seu compartilhamento entre várias baias de trabalho. Muitos bancos se tornaram clientes graúdos desses equipamentos.
O passo seguinte foi começar a instalar as novas agências de autoatendimento e quiosques de rua para vários bancos, como Itaú, Bradesco, Nacional, Noroeste, Safra, Econômico, Real…
José Maria calcula que sua empresa fez 5 mil agências de autoatendimento na soma de todos os clientes – 2 700 delas, só para o Bradesco.
Inquieto, José Maria começou a pensar em se distanciar desse trabalho para os bancos e passar a atuar em serviços.
Dessa busca saiu uma parceria com a Associação Paulista de Medicina (APM) para criar um negócio que guarda semelhanças com o atual DrApp: o Sinasa, desenvolvido entre 2003 e 2004.
“O Sinasa permitia o acesso a um médico particular a preços acessíveis. O valor básico da consulta tinha como referência o CBHPM (Classificação Brasileira Hierarquizada de Procedimentos Médicos) e era calculado em múltiplos e frações do que o médico prestava”, lembra José Maria.
“Só que, naquela época, ainda não havia internet no celular como hoje. E muitos médicos nem tinham computador instalado no consultório.”
Para fazer o Sinasa pegar, José Maria se aventurou num plano para viabilizar a compra de computadores de qualidade por um preço bom através de financiamentos.
Mas bateu tanta cabeça, ouviu recusas de bancos para pacotes de empréstimos consignados e acabou vendendo tão poucos computadores que decidiu sair do negócio em 2008, terminando sua associação com a APM.
DRAPP: UMA IDEIA RENOVADA
As circunstâncias não colaboraram, mas a ideia ficou na cabeça de José Maria. E o boom recente dos serviços por aplicativos de smartphone, desde pedir um táxi a fazer compras com um clique, fez o empresário acreditar que as chances de oferecer consultas médicas a preços menores teria mais chances de vingar agora.
Ele começou a desenvolver o que se tornou o DrApp há dois anos. Voltou a procurar a APM para trabalhar em conjunto, começou a montar a rede de médicos cadastrados (que chegou a reunir 3 mil profissionais), fechou com a Cielo um sistema de pagamentos via cartão, estabeleceu parcerias com 190 laboratórios – o grupo Fleury tem 38 através de sua rede a+. E amadureceu o desenvolvimento da plataforma para computador e aplicativo para celulares junto a um time de TI.
José Maria brinca que é usuário do próprio produto: “Vou num laboratório para fazer exames e ninguém sabe quem eu sou. Fiz dois ultrassons de abdômen e paguei 12% do valor de tabela”.
O empreendedor sênior (que completará 72 anos em janeiro) não dá sinais de cansaço e tem planos para o crescimento do DrApp – que ele pronuncia “Doutor A-pê-pê”. Entre eles, está um marketplace de remédios, pacotes seletivos em parceria com hospitais e uma poupança-saúde.
Com uma empresa enxuta, com 20 pessoas (entre TI, atendimento e administrativo), José Maria também pretende realizar uma expansão para, pelo menos, três grandes capitais: Rio de Janeiro, Curitiba e Salvador. Mas quer buscar investidores.
“Quero que alguém entre com capital para injetar na empresa e com gestão e inteligência de TI. Aceito até ficar minoritário, desde que o investidor faça um acordo de acionistas em que ele se comprometa em injetar ‘X’ dinheiro em ‘Y’ tempo para desenvolver o negócio e atingir objetivos claros”, define o empresário. “Eu quero é ter o DrApp atendendo uma grande faixa da população.”