• Uma clínica digital pelo WhatsApp para o público 50+: conheça a Nilo, que nasceu durante a pandemia

    Victor, Isadora e Rodrigo, os sócios da Nilo: Focada no B2B, a startup ofereceu seus serviços gratuitamente para o público final durante a pandemia e viu a demanda aumentar 1000%
    Jose Renato Junior | 3 out 2020

    Filho de um cirurgião cardiovascular e de uma dermatologista e sobrinho de uma cardiologista, é claro que Victor Marcondes de Oliveira não tinha outra opção a não ser cursar uma faculdade de… engenharia. Hein?

    “Queria ser médico quando era pequeno e fazia visitas com meu pai no Hospital Santa Catarina”, ele explica. “Entendia que a profissão tinha um impacto muito grande na vida das pessoas, mas percebi que era um impacto individual, para aquela pessoa. E percebi que como engenheiro eu poderia provocar um impacto diferente.”

    Com o objetivo de provocar isso em grande escala, Victor é hoje um empreendedor. Na hora de empreender, no entanto, não conseguiu fugir da “influência genética”: ele é fundador da Nilo, uma clínica multidisciplinar digital especializada no público acima de 50 anos.

    A Nilo não é o primeiro empreendimento de Victor. Com um duplo diploma em engenharia de produção pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo e pela Teshnische Universität Darmstadt, na Alemanha, ele trabalhou em consultoria antes de fundar, em 2016, a Cosmedical, uma empresa de equipamentos médicos de uso domiciliar, para tratamentos de cicatrização de úlceras, terapia capilar e recuperação muscular de atletas de alto desempenho.

    Enquanto tocava a Cosmedical, o engenheiro fez um MBA em Harvard. “Foi quando percebi que havia desafios maiores a serem resolvidos no país”, conta. “A Escola de Negócios de Harvard é onde mais tem se estudado modelos inovadores de saúde no mundo, onde se olha a saúde baseada em valor. Quando me formei, em 2019, pensei que tinha que voltar para o Brasil e empreender com isso em mente.”

    OLHAR A POPULAÇÃO ACIMA DE 50 ANOS FOI UMA QUESTÃO PESSOAL

    Foi uma questão bastante pessoal que fez com que Victor começasse a pensar no modelo da Nilo. “Minha avó de 93 anos tem demência por corpos de Lewy, uma doença que causa perda progressiva da função mental. Hoje ela não se alimenta, não reconhece mais ninguém, precisa de cuidador”, conta. “E vi como foi e continua sendo difícil para a família toda lidar com isso, embora seja uma família de médicos. E quis fazer algo por essa população mais velha.”

    A Nilo funciona pelo WhatsApp para que o usuário não precise instalar um app novo

    No país, há mais de 28 milhões de pessoas com mais de 60 anos. A faixa etária representa 13% da população do país.

    “Embora a população 60+ seja numerosa, não há muitas iniciativas voltadas para ela”, diz Victor.

    Com o público-alvo em mente, Victor conheceu duas pessoas que tornaram o negócio possível.

    Isadora Kimura, egressa da edutech Geekie e com um MBA pela Universidade de Stanford, e Rodrigo Grossi, com experiência na Bionexo, empresa de soluções digitais para a área de saúde, foram apresentadas a Victor por uma amiga empreendedora da área de saúde. Ela soube que os três estudavam o mesmo setor e fez a ponte.

    CLÍNICA VIRTUAL COM EQUIPE PRÓPRIA

    A conexão entre os três foi imediata: todos tinham a mesma percepção de que o público acima de 60 anos estava mal assistido. A Nilo nasceu então em janeiro como uma clínica virtual que oferece serviços de atenção primária e secundária para pacientes com mais de 50 anos – a idade foi baixada por causa da demanda que eles perceberam logo no começo.

    O atendimento ao cliente é 100% digital, mas a startup tem uma equipe própria de saúde, composta por médicos, enfermeiros, psicólogos e gerontólogos com especialização na faixa etária atendida e que passaram por instituições renomadas, como a Faculdade de Medicina da USP, o Hospital Sirio-Libanês e o Hospital Albert Einstein.

    “A ideia é que ela vire uma referência médica do paciente, como um médico de família, que está disponível 24 horas por dia”, conta Victor.

    Ela funciona pelo WhatsApp, uma ferramenta de fácil manuseio para essa população. “Optamos por essa plataforma para evitar que o usuário tivesse que baixar e aprender a manusear mais um aplicativo”, explica o empreendedor.

    COMO É UMA CONSULTA?

    À primeira vista, a Nilo é uma mensagem de WhatsApp que o paciente recebe e pela qual tem acesso à agenda de consultas, ao link da teleconsulta e, depois que ela é feita, à prescrição médica. Ele pode optar por incluir um familiar na mesma conversa, para que a pessoa tenha acesso a tudo e receba também um resumo da consulta.

    Após uma ampla avaliação de sua saúde, um plano único é criado para ajudar o paciente a cuidar da sua saúde. Ele pode optar por planos de envelhecimento saudável e de saúde mental ou por planos focados em questões de saúde física, como doenças crônicas.

    A partir desse primeiro contato, o paciente passa a ter interações periódicas com seu time de saúde tanto pelo Whatsapp como em teleconsultas feitas em outra plataforma digital. O paciente pode mandar mensagens a qualquer hora do dia ou da noite.

    “Cada paciente tem um médico e uma equipe responsáveis por ele. A ideia é que o atendimento seja o mais humanizado possível”, afirma o fundador.

    “A experiência de atender os pacientes 50+ online tem sido extremamente positiva e também bastante surpreendente”, afirma o médico geriatra Felipe Bozi, da equipe médica da Nilo. Para ele, em sua especialidade, o vínculo com o paciente e sua família é o mais importante para oferecer um tratamento adequado.

    Na plataforma que visualiza, o médico ou profissional da saúde coloca dados como motivo da consulta, resultados de exames e diagnósticos

    Felipe tinha lá suas dúvidas em relação ao modelo da telemedicina. “Antes de começar os atendimentos por telemedicina, tinha receio de como conseguiríamos estabelecer uma boa conexão pelo meio virtual”, diz. “Entretanto, tenho visto que o uso das ferramentas de vídeo e o trabalho integrado da equipe multiprofissional, que busca conhecer o paciente como um todo, tem permitido superar essa barreira e proporcionar um atendimento de qualidade.”

    Para ele, o fato de o gerontólogo ter um papel central na coordenação de cuidado de cada paciente na Nilo permite uma efetiva individualização do caso. “Sempre é levado em conta quem é esse paciente, quais são suas expectativas e sua história de vida. Isso é um diferencial no atendimento.”

    DEMANDA AUMENTOU MAIS DE 1000%

    A Nilo começou a operar em março, justamente quando o país começava a ser assolado pela pandemia do Sars-Cov-2, o vírus que provoca a Covid-19 – e quando todo mundo ficou em isolamento social e passou a entender e usar mais os recursos da telemedicina.

    Os sócios da Nilo optaram por oferecer o serviço, que funcionou como um projeto-piloto, de graça para a população.

    “A pandemia provocou a liberação da telemedicina, a princípio em caráter de urgência, e evidenciou que era preciso criar novos modelos de cuidado para a população mais velha, que é a mais vulnerável”, diz Victor.

    “Estávamos no lugar certo e na hora certa.”

    Em poucos meses a demanda aumentou 1000%, mas, segundo Victor, sem perder a qualidade. “Nosso NPS [Net Promoter Score, metodologia para medir a satisfação de clientes] é acima de 90”, afirma o CEO da startup. Esse crescimento exponencial mostrou também que a Nilo é uma solução escalável. Para manter-se durante esse período, a startup contou com um investimento de R$ 8 milhões de fundos como Canary e Maya Capital.

    Embora ainda atendam consumidores finais de graça, limitados à capacidade da equipe, o modelo de negócios da Nilo é B2B: seus serviços funcionam via parceria com alguns convênios e hospitais, ainda em andamento. “Acabamos de fechar três grandes clientes”, afirma o empreendedor.

    E a telemedicina corre risco depois do fim da pandemia? “A pandemia nos forçou a expandir os limites do que achávamos possível”, diz Victor. “É preciso, em alguns casos, ter atendimento presencial, mas a maior parte das pessoas que procuram o pronto-atendimento podia ter seu problema resolvido via telemedicina. Ninguém quer mais ficar três horas no PS porque está com dor de cabeça.”

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