• Tosse crônica pode ser fibrose cística. Doença acomete um a cada sete mil nascidos vivos no Brasil

    Verônica Stasiak Bednarzcuk, psicóloga
    Verônica Stasiak Bednarzcuk é psicóloga e fundadora do Unidos pela Vida - Instituto Brasileiro de Atenção à Fibrose Cística. (Foto: Divulgação)
    Jose Renato Junior | 20 set 2022

    No século passado, havia um ditado que dizia: “pobre criança cuja testa o beijo é salgado, está enfeitiçada e logo morrerá”.

    Esta máxima referia-se ao fato de que as crianças que apresentavam, repetidamente, quadros graves de infecções respiratórias, pneumonias, tosse constante, dificuldade para ganhar peso, estatura e diarreia, apresentavam também complicações muito severas, porque, infelizmente, ninguém sabia do que se tratava.

    Achavam, inclusive, que tudo isto era fruto de um “feitiço”, pois a semelhança entre todas as crianças era um sabor mais salgado sentido ao beijar a pele.

    Graças à evolução da medicina e da ciência, hoje este ditado faz parte apenas das histórias do século passado.

    Nas últimas décadas, os pesquisadores passaram a conhecer a doença e os pacientes conseguem manejar muito melhor sua rotina com a fibrose cística, que é uma das doenças raras mais comuns.

    De origem genética e ainda sem cura, a fibrose cística acontece por conta de um defeito na condução de uma proteína chamada CFTR, que, por consequência, torna a secreção do organismo muito mais espessa que o normal, dificultando sua eliminação e gerando os sintomas descritos anteriormente.

    Hoje, já é possível identificar a doença por meio do teste do pezinho, garantido por lei em todo Brasil e parte do programa nacional de triagem neonatal. O exame precisa ser feito entre o 3º e 7º dia de vida do recém-nascido, e, se apresentar alteração, deve ser refeito para que, então, o paciente seja encaminhado ao teste do suor, considerado padrão ouro para diagnóstico da doença.

    Este segundo teste, inclusive, pode ser feito a qualquer tempo da vida para confirmar ou excluir a hipótese diagnóstica de crianças, jovens ou adultos que apresentem sintomas.

    Foi assim comigo, inclusive. Aos 23 anos, eu já acumulava no meu prontuário dezenas e dezenas de pneumonias: em média quatro por ano desde que nasci.

    Aos 19 anos, descobrimos que, justamente por essa quantidade imensa de infecções respiratórias, uma parte do meu pulmão já não funcionava mais e, por isso, precisei fazer a retirada do lobo superior do pulmão direito.

    No pós-operatório, devido a uma necrose no lobo médio, precisei também fazer uma nova cirurgia para a retirada dessa segunda parte. Mas foi somente aos 23 anos, depois de dezenas de cirurgias, infecções e pneumonias, que enfim descobri que eu também tinha fibrose cística.

    Por conta desse diagnóstico que, cá entre nós, salvou minha vida – dadas as proporções da complexidade de se conviver com uma doença crônica e grave como a fibrose cística -, eu optei por não guardar essa valiosa informação só para benefício próprio.

    Fundei, então, o Unidos pela Vida – Instituto Brasileiro de Atenção à Fibrose Cística, reconhecido hoje, quase onze anos após sua fundação, como uma das 10 melhores ONGs de pequeno porte do Brasil, dentre as 100 melhores do país.

    Dentre dezenas de projetos e ações que realizamos está o Setembro Roxo – Mês Nacional de Conscientização da Fibrose Cística. Neste ano, nosso mote é “Nossa Luta tem Muitos Nomes”, pois para defender e garantir que todas as pessoas com fibrose cística tenham acesso ao diagnóstico precoce e ao que há de melhor em tratamento, é preciso muita luta, e muita gente ao nosso lado.

    E uma das nossas principais batalhas, no momento, é para que os pacientes tenham acesso às novas terapias pelo Sistema Único de Saúde (SUS).

    Conhecidas como moduladores da proteína CFTR, estes medicamentos, embora não sejam a cura, tornam a secreção muito mais fluida, diminuem inflamações e, segundo os pacientes, “dão fôlego nunca sentido”. É a virada de chave da vida de quem tem fibrose cística.

    A primeira tecnologia foi aprovada pelo FDA (Food and Drug Administration) americana em 2012. No Brasil, foi aprovada pela Anvisa em 2018 e, somente agora, final de 2022, está chegando pelo SUS nas mãos dos pacientes que são elegíveis.

    Além dela, outras três medicações já foram aprovadas pela Anvisa, mas duas já foram negadas para a incorporação no SUS. Uma quarta tecnologia, conhecida como combinação tripla, é a maior esperança no momento, pois impacta a maioria dos pacientes que apresentam uma das mutações mais comuns da doença.

    Neste Setembro Roxo, lhe convido a conhecer mais sobre a fibrose cística, compartilhar estas informações que podem salvar a vida de muitas pessoas e unir-se à nós nesta luta que, embora já tenha muitos nomes, pode contar também com o seu.

    Acesse setembroroxo.unidospelavida.org.br e faça parte desta luta.

    Verônica Stasiak Bednarzcuk é mestranda em Ciências Farmacêuticas com ênfase em Avaliação de Tecnologias da Saúde pela UFPR; psicóloga; fundadora e diretora executiva do Unidos pela Vida – Instituto Brasileiro de Atenção à Fibrose Cística; Membro do Grupo Brasileiro de Estudos em Fibrose Cística. Foi diagnosticada com fibrose cística tardiamente aos 23 anos, e, desde então, vem dedicando-se a estudar e a trabalhar pelo tema, com foco também em políticas públicas, ATS e Advocacy.

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