• Como a Saúde iD, uma startup que nasceu no Fleury, quer oferecer não só acesso, mas cuidado coordenado da saúde

    Hans Lenk, o CEO da Saúde iD
    Jose Renato Junior | 15 set 2021

    Quando o executivo Hans Lenk ouve alguém falando sobre tornar o paciente protagonista dos cuidados com sua saúde, em um cenário em que o acesso não é nada democrático, é esta a imagem que vem em sua cabeça.

    “Esse GIF do John Travolta é muito o retrato da injustiça que me parece sofrer a pessoa que nem acesso à saúde tem direito e ouve falar de empoderamento do paciente. Ela fica: ok, mas para onde eu vou?”, diz Hans. “Nós fazemos saúde há 100 anos. Tínhamos que ajudar.”

    Hans é CEO da Saúde iD, uma startup que nasceu dentro do Grupo Fleury há um ano para trabalhar em dois sentidos: encontrar um modelo que garanta a sustentabilidade do setor de saúde ao mesmo tempo em que oferece acesso aos excluídos dele.

    A Saúde iD é um marketplace de saúde que, por meio de assinaturas mensais de baixo custo, conecta o usuário a médicos, hospitais e clínicas, além de oferecer cirurgias e procedimentos.

    Mas é também uma plataforma de gestão para empresas, operadoras e médicos. Com ela é possível, diz Hans, melhorar a eficiência da gestão na jornada do paciente. 

    Baseada em ciência de dados e em inteligência artificial, a solução pretende ajudar a cuidar da saúde dos beneficiários de forma otimizada.

    A ideia é que o paciente possa, de fato, ter uma visão única e integrada de sua saúde para, como diz, Hans Lenk, tornar-se de verdade protagonista dela – e, ao contrário de John Travolta, saber para que lado seguir.

    DOIS EM UM: SETOR MAIS SUSTENTÁVEL E ACESSO A MAIS PESSOAS

    “Nos últimos anos, a inflação médica no país tem sido sempre acima de 10% e, portanto, bem acima da inflação oficial”, diz Hans Lenk. 

    Pacientes, médicos, operadoras e empresas que contratam serviços como planos de saúde para seus funcionários sofrem em seus bolsos o resultado dessa conta difícil de ser fechada. 

    “Isso acabou gerando o surgimento de quase 900 startups só no setor de saúde. Todo mundo está olhando para isso tentando melhorar a dinâmica.”

    Por outro lado, diz o CEO, apenas 25% dos brasileiros podem contar com um plano de saúde e não dependem exclusivamente do SUS (Sistema Único de Saúde). 

    “O Fleury sempre olhou além da medicina diagnóstica. Sempre foi pioneiro e preocupado com a sustentabilidade do setor, com a qualidade”, afirma o executivo. 

    “E percebemos que havia uma oportunidade de fazer algo diferente, de usar o nosso protagonismo a favor do setor de saúde.”

    Os debates sobre como tentar resolver esses gargalos todos começaram em 2017. E as pesquisas de benchmark também. “Fomos procurar quem já fazia isso muito bem, quem conseguiu vencer nesse jogo de dar acesso e com modelos de negócio diferentes”, diz ele.

    Os estudos incluíram startups do Vale do Silício, de Israel e da China. “A gente precisava de inspiração, de material, até encontrar um modelo de negócio vencedor.”

    No fim de 2018, o Fleury comprou a SantéCorp, empresa do ramo de serviços de gestão de saúde e medicina assistencial. “Foi quando pensamos que talvez fosse melhor começar por gestão de saúde, e depois ir ampliando”, diz Hans.

    “Nos cercamos de muitos parceiros e consultorias para refinar o modelo, até a gente concretizar o produto em setembro de 2020.”

    SOLUÇÃO LANÇADA SEIS MESES APÓS A PANDEMIA

    Lançada nessa data, a Saúde iD era a princípio uma solução B2B para oferecer ferramentas de gestão para controle de custos e também de atendimento coordenado, como EMR, atenção primária – e telemedicina.

    A startup chegou ao mercado seis meses após a pandemia de Covid-19. “A telemedicina estava sendo muito demandada por todos”, lembra Hans.

    “Nosso compromisso foi, no começo, colocar de pé um produto robusto, forte, para que a gente conseguisse atender a maior quantidade de pessoas possível.”

    O foco foi então no desenvolvimento deste que hoje é um produto dentro da Saúde iD, o PA Digital, para evitar idas desnecessárias ao pronto-socorro – e reduzir a taxa de absenteísmo nas empresas.

    O serviço, que alcança 90% de resolutividade dos casos, reduz também a taxa de sinistralidade dos planos, porque o paciente só o usa em casos mais graves. 

    Em fevereiro, a Saúde iD passou a vender serviços de assinatura de saúde para pessoas físicas, a preços que variam de R$ 29,90 a R$ 59,90 e oferecem consultas de telemedicina, exames de rotina e descontos em produtos e serviços, como medicamentos.

    “A partir daí direcionamos nossos esforços em dar tração e velocidade para o que de fato traz para o produto esse impacto que vai alcançar o setor, endereçando os programas de acesso, gestão e qualidade de saúde dos indivíduos.”

    Esses serviços existem no mercado, mas estão pulverizados. “Não há concentração deles em um único lugar”, diz o CEO. 

    “Por isso, criar e facilitar a busca e a recomendação, através dos canais digitais e, principalmente, personalizar a jornada utilizando inteligência médica e tecnologia é a minha missão. E vamos entregar isso num curto espaço de tempo.”

    TEM UM MARKETPLACE, NÃO É UM MARKETPLACE

    O CEO tem o cuidado de explicar que a Saúde iD não É um marketplace de saúde. “Saúde iD TEM um marketplace, mas é mais que isso”, ele diz, enfatizando o verbo “ter”.

    Um marketplace é uma plataforma que vende um produto ou serviço para alguém – e se monetiza com uma taxa sobre as transações, como é o caso da solução do Fleury. 

    “Mas, quando se é uma plataforma que também é uma healthtech, o que oferecemos vai além.”

    Diz Hans que há outra camada nessa plataforma, que é a coordenação da saúde na jornada do indivíduo, baseada em tecnologias como ciência de dados e IA. 

    “Isso acontece de maneira superpersonalizada, porque o que é bom para você talvez não seja o ideal para mim”, afirma ele. 

    “Por isso, entre o comprador e o vendedor, que existem nos marketplaces tradicionais, temos um centro que faz a orquestração. Assim, unimos o usuário exatamente com o que ele precisa.”

    Isso é especialmente interessante para quem está fora da saúde suplementar hoje – ou seja, os 75% da população que não têm plano de saúde. 

    “Durante grande parte da minha vida, da adolescência até o início da fase adulta, eu mesmo não tinha plano de saúde e sei como era difícil depender de vários fatores para ter acesso aos cuidados”, conta Hans Lenk.  

    “Confiamos tanto na solução que acabamos de captar R$ 1 bilhão em debêntures atrelado a metas de ESG”, afirma. “Não é algo da porta para dentro. Agora nos colocamos em exposição.”

    Ele se refere à emissão de debêntures concluída em julho com juros atrelados ao cumprimento da meta de alcançar 1 milhão de clientes das classes C, D e E na Saúde iD até 2026.

    “E nós não captamos R$ 100 ou 200 milhões, e sim R$ 1 bilhão. Então esse é o nível de confiança que a gente tem em nosso modelo de negócio.”

    NASCIDA DE UM GRANDE GRUPO, STARTUP RESOLVE UM DILEMA

    Como uma startup que nasceu de um grande grupo, Hans afirma que a Saúde iD tem particularidades. “Uma plataforma precisa ter um grande número de usuários para que os vendedores queiram colocar as suas soluções ali”, explica.

    Por outro lado, se lá não houver vendedores, o usuário também não vai querer se conectar – é o tal do dilema do ovo ou da galinha, ou chicken or egg

    “Como a gente surge de um grande grupo, já temos, logo na partida, quase 300 unidades, entre 10 e 15 marcas existentes em 10 estados diferentes, um portfólio de produtos e serviços enorme, clientes e contatos na cadeia”, enumera. “E isso dá uma vantagem gigantesca.”

    Há dois meses, a Saúde iD anunciou um novo serviço, o de cirurgias a preços mais acessíveis: em média, R$ 4 mil pelo “pacote completo”, incluindo pré-operatório, internação, pós-operatório, consultas, honorários médicos.

    Com isso, o plano é reduzir a quantidade de cirurgias represadas no SUS, cerca de 3 milhões, das quais metade são referentes a cinco procedimentos: hérnia, vesícula, catarata, amígdalas e varizes. 

    “São procedimentos de baixa complexidade, alta previsibilidade de custos e ciclo pós-operatório muito mais curto”, afirma Hans. “Mas, claro, elas devem ser feitas com recomendação médica. O médico é um ator fundamental dentro dessa jornada, nada é feito sem ele.”

    UM FUNDO PARA INVESTIR EM SAÚDE – COM O SABIN

    Hans Lenk é também o homem à frente do Kortex Ventures, um fundo de corporate venture capital voltado para a saúde criado em novembro do ano passado em parceria com o Grupo Sabin.

    O fundo tem R$ 200 milhões para investir em startups em troca de uma posição acionária minoritária em cada empresa. O foco está no desenvolvimento de pequenas empresas com negócios voltados à medicina preventiva, diagnóstica e de saúde digital.

    “O Kortex já é um dos principais veículos de investimento em saúde no Brasil, e o que trazemos para mesa é o conhecimento em saúde”, diz ele.

    “Quando Fleury e Sabin se unem para olhar para uma startup, o que conseguimos oferecer é quase uma unfair advantage”, ele brinca.

    “Tudo o que uma startup mais precisa é direcionamento, contatos, clientes – e isso tudo a gente consegue oferecer, além de dinheiro.”

    Kortex e Saúde iD se encontram, afirma o CEO, quando o fundo consegue olhar para essas startups como clientes ou fornecedoras. O primeiro investimento do Kortex foi na startup israelense Sweetch.

    A empresa, especializada em prevenção e gestão de doenças crônicas com o auxílio de uma plataforma de IA, oferece ferramentas que promovem a mudança de comportamento de indivíduos com risco de afecções crônicas. “Ela já está plugada em Saúde iD”, conta Hans.

    “Quando eu olho para o propósito de Saúde iD, que é muito mais do que dar acesso, é também pegar pela mão e ajudar na coordenação de jornada, me dá um orgulho muito grande”, diz Hans.

    “Tenho certeza que, em uns anos, vamos estar falando da principal plataforma de saúde do Brasil”, afirma Hans Lenk. “O Fleury sempre fez muito, mas era muito discreto. Agora estamos contando melhor essa história.”

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