• Teste de câncer, detecção do Flurona: como um laboratório alemão usa a biotecnologia para criar exames mais precisos

    Paulo Gropp, vice-presidente da Qiagen na América Latina
    Jose Renato Junior | 21 jan 2022

    Criado pelo médico grego Georgios Papanicolau há quase um século, o exame que leva seu sobrenome é o mais utilizado para o diagnóstico de lesões precursoras do câncer do colo do útero.

    Desde que foi adotado mundialmente, a partir do fim dos anos 1940, o teste salvou a vida de milhões de mulheres – conseguiu reduzir em 70% o número de mortes. O Papanicolau detecta 95% dos cânceres cervicais ainda em um estado no qual não podem ser observados a olho nu. 

    Mas na medicina mesmo o que é bom pode ser melhorado. E o Papanicolau tem uma, digamos, versão 2.0 turbo: o teste chamado Captura Híbrida. 

    Método com resultados bastante eficazes, a Captura Híbrida, desenvolvida por meio da testagem molecular, é um teste sensível, que detecta o DNA do vírus HPV. Por isso, não é necessária sequer a presença da lesão para o diagnóstico da patologia. 

    “A Captura Híbrida foi uma das primeiras tecnologias que conseguiram detectar o DNA do vírus HPV”, afirma Raphael Oliveira, gerente de Marketing Regional da América Latina para Diagnósticos Moleculares da Qiagen, multinacional alemã especializada em biotecnologia.

    “Apesar de já existir há mais de 20 anos, ser considerada o padrão ouro para a identificação do câncer do colo de útero e ser usada em massa em boa parte da Europa, EUA e Austrália, a Captura Híbrida ainda não foi adotada em massa no Brasil”, conta ele. 

    Segundo Raphael, o exame é a tecnologia pioneira para detectar o câncer de  colo de útero – e possibilita uma identificação mais precoce, auxiliando no tratamento.

    “O Papanicolau consegue identificar alterações nas células do colo do útero, que podem ou não ter influência de uma infecção pelo HPV”, explica Raphael. 

    “Já a Captura Híbrida consegue identificar a presença do material genético do vírus do HPV em uma pequena amostra dessas mesmas células, mesmo que ainda não existam lesões.”

    Isso, portanto, garante mais precisão ao método. “A partir de um resultado negativo, a recomendação de novo rastreio é a partir de cinco anos”, diz o gerente de Marketing.

    Segundo Paulo Gropp, vice-presidente da Qiagen na América Latina, mais de 100 milhões de mulheres já fizeram esse teste molecular globalmente.

    “Além disso, temos estudos clínicos que, ao serem somados, já testaram mais de 1 milhão de mulheres em todo o mundo. Dessa forma, temos uma vasta literatura científica apontando os benefícios da Captura Híbrida”, diz.

    “Vale ressaltar que esse é um teste robusto, possui diversos controles e calibradores, o que garante um resultado confiável.”

    JANEIRO VERDE E A PREVENÇÃO AO CÂNCER DE COLO DE ÚTERO

    Janeiro, além de Branco por causa da campanha de alerta à importância da saúde mental, é Verde – e isso tem a ver justamente com a chamada de atenção para a prevenção de colo de útero.

    O tumor é causado pela infecção persistente por alguns tipos do Papilomavírus Humano, ou HPV, transmitidos durante a relação sexual e no contato direto com pele ou mucosas infectadas.

    De acordo com o Instituto Nacional de Câncer (Inca), este é o terceiro tipo de tumor mais comum na população feminina brasileira, e a quarta causa de morte mais frequente entre as mulheres no país.

    A estimativa do Inca é de que, apenas em 2021, 16.710 novos casos tenham sido descobertos e mais de 6 mil mulheres tenham perdido a vida. 

    Acredita-se que entre 25% e 50% da população feminina e 50% da população masculina mundial esteja infectada pelo HPV. Porém, a maioria das infecções é transitória e acaba combatida espontaneamente pelo sistema imune.

    Estudos mostram que são 13 os tipos de HPV os principais causadores do câncer de colo de útero. A presença prolongada desses vírus no organismo acaba causando lesões no colo do útero, que evoluem de forma maligna para o câncer. 

    O ideal é, assim, fazer periodicamente exames preventivos – eles podem identificar a presença do vírus antes mesmo de uma lesão acontecer. 

    “O Papanicolau foi o primeiro teste a conseguir identificar as alterações celulares causadas pelo HPV, ele já existe há mais de 80 anos”, explica Raphael. 

    “Por isso, muitos médicos já estão acostumados com essa metodologia. Além disso, esse teste está disponível no SUS e é de acesso gratuito a toda a população feminina.”

    A Captura Híbrida, apesar de ter 20 anos de existência, é ainda uma “nova tecnologia” no cenário brasileiro, explica o gerente. 

    “Muitos médicos não conhecem ou possuem resistências às novas técnicas. O fato de não estar disponível no SUS nacionalmente também impacta.” O teste, no entanto, tem cobertura obrigatória por todos os planos de saúde, alcançando 23% da população. 

    O teste QIAstat

    UMA GAMA DE TESTES PARA DIAGNÓSTICOS MAIS PRECISOS

    Fundada em 1984 na Alemanha, a Qiagen atua no Brasil na área de biotecnologia desde 2008, onde oferece uma gama imensa de produtos biotecnológicos. 

    Um deles, o QIAstat-Dx, ganhou a mídia nas últimas semanas por estar sendo utilizado em diversos hospitais de referência do país como uma importante ferramenta de testagem capaz de identificar se o paciente está contaminado por mais de um agente infeccioso ao mesmo tempo.

    Isso está sendo especialmente importante atualmente, quando a variante Ômicron do vírus Sars-Cov-2, que causa a Covid-19, está amplamente disseminada no país ao mesmo tempo em que ocorrem surtos de gripe causada pelo vírus Influenza H3N2. Os vírus podem, inclusive, ​​infectar simultaneamente um paciente – o que provoca a chamada “flurona”.

    O QIAstat-Dx identifica, entre 22 principais agentes (bactérias e vírus), qual é o causador dos sintomas respiratórios no paciente. Assim, ele auxilia no diagnóstico correto de doenças que têm sintomas muito parecidos.

    A Qiagen disponibiliza ainda ensaios de PCR em tempo real (qPCR) e sequenciamento genético. “Ambos os ensaios possibilitam a identificação de mutações pontuais ou estruturais, que permitem ao oncologista ter acesso à informação genética do paciente”, explica Allan Munford, gerente Regional LaTam de Marketing para Diagnósticos de Oncologia e Precisão da empresa.

    “Ele consegue, com a tecnologia, buscar mutações em genes específicos. Com isso, também possibilita ao médico identificar os melhores tratamentos atualmente disponíveis.”

    Outro produto da Qiagen é o PCR digital, ou dPCR. “Também chamada de 3ª geração de PCR, tem como principal avanço da metodologia a possibilidade de realizar um particionamento, ou divisão, das moléculas de DNA que serão analisadas”, diz Allan. 

    Ele explica melhor: “Seria como dividir uma reação de PCR de primeira ou segunda geração – aquelas que ficaram famosas por causa dos testes de Covid-19 – em milhares de pequenas reações. Isso permite com que eventos raros não sejam ocultados por eventos de maior frequência”. 

    Segundo Allan, ao minimizar esses efeitos da competição entre os eventos frequentes e os raros, o PCR Digital supera as dificuldades inerentes à amplificação de sequências raras, permitindo a quantificação absoluta sensível e precisa do DNA. 

    Allan Munford, gerente Regional LaTam de Marketing para Diagnósticos de Oncologia e Precisão da empresa

    O ETERNO DESAFIO DO ACESSO À POPULAÇÃO

    Essa alta sensibilidade, precisão e capacidade de quantificação tornam o PCR Digital uma tecnologia usada nas mais variadas e desafiadoras análises.

    “Por exemplo, na biópsia líquida, na detecção de organismos causadores de doenças – os chamados patógenos –, na análise de expressão gênica, na variação de número de cópias e em análises de mutações raras”, enumera Allan Munford. 

    “Ou seja, desde a área de medicina preventiva e pesquisas médicas, até mesmo para análise genética de uma exportação de grãos, por exemplo.”

    De forma geral, a população brasileira não tem acesso a testes de última geração como esses exames genéticos. Allan Munford acredita que uma simples conta matemática deveria ser feita pelos governos.

    “Existem diversos estudos que apresentam dados consistentes sobre o custo total que um paciente com câncer representa aos cofres públicos e como um trabalho preventivo poderia gerar não somente uma forte economia a médio e longo prazo, mas salvar milhares de vidas por ano”, diz ele. 

    “Estamos falando de vidas – e os investimentos e políticas públicas deveriam ter a saúde dentro do foco principal, bem como ampla divulgação e educação médica.”

    OS CARROS-CHEFES E OS PLANOS FUTUROS

    Com mais de 5.200 colaboradores distribuídos em 25 países, a Qiagen conta no país com uma estrutura composta por 85 colaboradores que atuam em todo o território nacional. 

    “O fato de ter um escritório regional e ter à disposição uma estrutura de serviços e gerenciamento de estoque local traz um imenso benefício aos nossos clientes, que podem contar com rápida atuação e atendimento em português”, pontua Marcio Tomiyoshi, gerente de Marketing Regional LaTam para Diagnósticos Moleculares da empresa.

    Por aqui, em relação aos produtos, os carros-chefes são a Captura Híbrida, o QuantiFERON-TB Gold Plus (teste referência incorporado ao SUS e ANS para detecção da infecção latente por tuberculose) e uma grande gama na extração de ácidos nucleicos. 

    “Somos reconhecidos mundialmente como a empresa ‘gold standard’ na extração de ácidos nucléicos – DNA, RNA e outros – das mais diversas origens, como vírus, bactérias, plantas, traços residuais etc.”, conta. 

    “Na área diagnóstica, temos forte atuação na detecção de doenças infecciosas, como tuberculose e do HPV. E a área de oncologia e diagnóstico é outro segmento bastante atual e forte da Qiagen”, enumera Marcio.

    Em breve, a Qiagen pretende lançar diversos novos testes de qPCR, dPCR e sequenciamento de nova geração em parceria com indústrias farmacêuticas. 

    “Isso possibilitará que os pacientes tenham acesso a diagnósticos que os habilitem para tratamentos personalizados com novas drogas que surgirão no mercado”, ele diz, mencionando a medicina de precisão. 

    “Também devemos trazer em breve o QIAreach QuantiFERON – teste rápido para detecção da infecção latente por tuberculose. É a tecnologia do ‘irmão mais velho’ QuantiFERON-TB Gold Plus.”

    Deve chegar ao mercado brasileiro também o QIAsure, teste de rastreamento do câncer do colo do útero que permite que os médicos vejam o que está acontecendo em nível molecular para determinar se as células do colo do útero estão se transformando ativamente em câncer.

    “Além deles, temos ampliados os testes sindrômicos como o QIAStat no mercado brasileiro”, conta Marcio. 

    “Trata-se de uma plataforma simples e rápida para emergências, por exemplo, muito utilizada em situações nas quais o paciente apresenta sintomas comuns e é necessário um exame prático que consiga determinar qual a exata enfermidade ele possui, e qual a prevalência.” 

    Devem somar-se ao painel para quadros respiratórios, que detecta o coronavírus e o Influenza, outros painéis. 

    “Importante ainda lembrar que aprendemos muito com a Covid em relação à gestão de estoque e retorno de crises. No momento, nossos kits são capazes inclusive de detectar a nova variante Ômicron.”

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