• “O que eu ainda não sei que não sei? Esse questionamento é uma constante na Hapvida”, diz head de inovação e design

    Fabio Calzavara explica por que a maior operadora de planos de saúde do Norte e do Nordeste – que causou alvoroço ao anunciar que pretende unir-se à NotreDame Intermédica – está procurando startups para ajudar a solucionar seus desafios internos.
    Jose Renato Junior | 27 jan 2021

    Maior operadora de planos de saúde do Norte e do Nordeste, a Hapvida causou alvoroço no começo deste ano. Ela figurou no noticiário de economia do país ao anunciar sua intenção de fundir-se à NotreDame Intermédica

    O frenesi não é à toa. Com mais de 6,7 milhões de clientes, a Hapvida hoje se posiciona como um dos maiores sistemas de saúde suplementar do Brasil.  A NotreDame Intermédica tem em seu portfólio mais de 3,6 milhões de clientes. 

    Juntas, as duas seriam a maior empresa de plano de saúde do mundo, com mais de 13,5 milhões de usuários entre planos de saúde e odontológicos e valor de mercado de R$ 118 bilhões, mesmo patamar da Rede D’or. 

    Seja qual for o desfecho da história, a Hapvida vem mostrando que está atenta às movimentações do mercado – e, claro, às inovações. 

    “A Hapvida tem histórico de ser uma empresa inovadora, e nossa missão é manter isso, trazendo cada vez ainda mais inovação para dentro da nossa cultura”, afirma Fabio Calzavara, Head de Inovação e Design do Hapvida.

    Há quase dois anos e meio na companhia, Fabio está à frente do Explora, programa-piloto de inovação aberta com startups que a Hapvida realiza com a Kyvo Design-Driven Innovation. A ideia é encontrar, no ecossistema de inovação, startups que resolvam cinco desafios da operadora de plano de saúde.

    Com início no fim de 2020, o programa anunciou recentemente as cinco empresas que passam agora por um processo de imersão para implementar projetos de inovação na Hapvida. 

    São elas: Cinnecta, que vai ajudar a criar oportunidades a partir dos dados gerados pela empresa; Zetta, escolhida para auxiliar a melhorar a gestão de saúde e bem-estar do cliente a partir do seu histórico; Avatar da Saúde, que pretende dar escala a programas de saúde preventiva; Flow, para criar um canal mobile único de comunicação e serviços de RH com os colaboradores da Hapvida; e Kludo, que entrou para ajudar no desafio de implementar uma ferramenta para treinamento e sensibilização quanto à LGPD.

    As startups terão recursos para implementação dos pilotos de até R$ 16 mil, contato com diferentes áreas da organização, mentorias com executivos e possibilidade de rollout a partir dos resultados apresentados e do seu  potencial. 

    Fabio bateu um papo com Future Health para falar sobre o Explora e sobre a inovação na Hapvida, que conta, como parte de seu sistema, com as operadoras do Grupo São Francisco, RN Saúde, Medical e Grupo São José Saúde. A operação tem ainda mais de 36 mil colaboradores diretos envolvidos nela, 15 mil médicos e 15 mil dentistas, além de 47 hospitais, 191 clínicas médicas, 46 prontos atendimentos, 175 centros de diagnóstico por imagem e coleta laboratorial.

    Por que a Hapvida decidiu ter uma área voltada à inovação e ao design? Como design e inovação se associam?
    Sou da área da informação e comecei a trabalhar com inovação na sequência da minha carreira, depois de uns cinco, seis anos de experiência. Os melhores benefícios que a disciplina do design traz são o foco em trabalhar necessidades e expectativas das pessoas. O esforço do designer está muito em trazer soluções criativas que resolvam o problema ou que atendam a essas necessidades criativas. Já quando trazemos o conceito da inovação, especialmente para o segmento da saúde, os objetivos casam muito bem. Aqui na Hapvida a gente cuida da vida das pessoas, algo extremamente importante. 

    A disciplina do design nos ajuda a investigar quais são as expectativas das pessoas quando a gente fala de saúde. Trazemos então, com esse olhar humanizado, soluções criativas. E, a partir daí, vai se fomentando a inovação. 

    O maior ganho do design está, portanto, nesse olhar humanizado para descobrir quais são as necessidades e as expectativas das pessoas, e a criatividade na hora de desenhar algo novo. Muitas empresas trabalham a inovação de forma diferente. E acredito que o nosso diferencial é esse. Isso nos ajuda a entender bem o nosso beneficiário, entender bem o nosso médico, nosso colaborador, nossos parceiros. E, assim, trazer soluções que sejam diferentes para o mercado. 

    E como é a estrutura da área? Quais caminhos a inovação percorre?
    Nossa área de inovação está estruturada em três frentes. A primeira é inovação interna, em que trabalhamos muito as ações de cultura de inovação, de transformação de mindset, para estimular os nossos colaboradores para pensarem dessa forma cada vez mais inovadora. 

    A Hapvida tem histórico de ser uma empresa inovadora, e nossa missão é manter isso, trazendo cada vez ainda mais inovação para dentro da nossa cultura.

    Inovação é um pilar e também um diferencial muito bacana, porque a gente não vê isso em empresas de saúde capital aberto no Brasil tão frequentemente. Portanto, na inovação interna, a missão é estimular, sempre se questionar, se reinventar, aplicar novas boas práticas, métodos de trabalho. A segunda vertical é um olhar para fora – é a parte da inovação aberta. 

    Estamos muito próximos do ecossistema das startups, inclusive com o programa Explora, com o time da Kyvo. 

    Essa é uma das nossas ações dessa vertical. Temos ainda um acordo de cooperação com a Secretaria de Ciência e Tecnologia do estado. Não olhamos só para o que é tendência do mercado, que são as startups, mas também conversamos muito com as universidades, com o governo e com os nossos beneficiários, evidentemente, para entender o que está acontecendo e trazer essas novidades. Já a terceira vertical está relacionada a tecnologia e produtos digitais. Materializamos os insights e as soluções tanto internamente quanto trazendo do mercado. É aqui que tangibilizamos tudo em produtos digitais. 

    Muitas das startups e das healthtechs estão concentradas no Sudeste e no Sul. Como está o cenário desse ecossistema no Nordeste?
    Dentro do nosso programa Explora, tivemos um resultado bem legal das inscrições das startups que é um pouco o retrato de como o Brasil está nesse sentido. Foram 169 inscrições, 90 startups de 14 estados, contemplando todas as regiões do país. Temos startups do Sul, Sudeste, Centro-Oeste, Norte e Nordeste – aqui, há empresas de cinco estados. 

    Para a Hapvida, o ecossistema especificamente de startups, novas empresas voltadas à tecnologia e inovação, está já muito bem distribuído no Brasil.

    Claro, São Paulo é o principal centro financeiro. Mas a transversalidade da presença geográfica das startups foi uma coisa que deixou a gente muito feliz. Nossa atuação com inovação aberta visa, claro, trazer mais qualidade, mais acolhimento para o nosso beneficiário, mas a gente também quer estimular, quer devolver para o ecossistema.

    A Hapvida é uma empresa muito grande, com diversas expertises, e queremos contribuir para o desenvolvimento desses empreendedores. 

    Ficamos, portanto, muito felizes de ver que tem não só as comunidades já bem estabelecidas aqui, como a Rapadura Valley ou o Cariri Valley, mas, além dessa clusterização, a nossa mensagem está sendo absorvida por grupos ainda mais diversos. Tivemos inscrições de startups tanto do Amazonas como do interior do Paraná, de Toledo. A questão da distância já não é mais uma barreira.

    O Explora é o primeiro programa de aceleração da Hapvida, certo? Me conta os bastidores dele? 
    Sim, o Explora é o primeiro programa estruturado a trabalhar com inovação aberta aqui dentro do Hapvida. Houve duas motivações. A primeira era percebermos que conhecíamos muito nosso beneficiário e o mercado, mas veio uma curiosidade, uma pulguinha atrás da orelha.

    O que o mercado está pensando que eu ainda não conheço? O que eu não sei que não sei? Esse questionamento é uma constante aqui.

    Vimos que era preciso investigar o mercado para trazer mais qualidade para atendimento do nosso beneficiário. A segunda motivação foi perceber que, internamente, havia essa vontade de as áreas trabalharem com startups. Iniciativas pontuais aconteciam de parcerias: algum diretor que conhecia uma solução, uma área que queria fazer negócio ou trazer a startup para fazer um piloto, uma experimentação. 

    Se a empresa tem vontade, por que não criarmos um modelo estruturado, pensar certinho, com começo, meio e continuidade, e não começo, meio e fim?

    Então juntamos a fome com a vontade de comer. A ideia é que seja um programa que vá gerando uma transformação constante dentro da empresa. Queremos estimular essa cultura de inovação e manter o DNA questionador, transformador da Hapvida constante. A importância de ter o programa estruturado está muito nessa constante reinvenção. 

    O programa foi criado em cima de cinco desafios internos da Hapvida. Quais eram eles e o que vocês esperam?
    Esses cinco desafios são reflexos desse desejo da transformação constante nossa aqui dentro da Hapvida. Não que eles sejam necessariamente um problema para nós, mas os encaramos como um estímulo para inovar e transformar sempre. Não impusemos nada, o presidente não impôs nada. Propor os desafios foi uma coisa espontânea dos nossos diretores, dos executivos. 

    Esses cinco desafios refletem bem a nossa visão de presente e de futuro.

    Um deles é como dar escala a programas de saúde preventiva. Sempre falamos aqui que não é uma questão de tratarmos de doença, mas de saúde, de bem-estar, de vida. Outro desafio é como implementar uma ferramenta para treinamento e sensibilização quanto à LGPD. Esse é um assunto global, todas as empresas têm que se preocupar com o tema e a Hapvida está se antecipando ainda mais nessa questão. 

    Outro desafio é o de criar um histórico unificado do cliente. Com ele, queremos ser ainda mais proativos na gestão de saúde e bem-estar do nosso beneficiário. 

    Olhando internamente para os nossos colaboradores, que são peças fundamentais para a engrenagem da empresa, pensamos no desafio de como criar um canal mobile único de comunicação e serviços de RH com eles. O quinto desafio é como criar oportunidades a partir dos dados gerados pela empresa. A ideia é trabalhar de forma cada vez mais inteligente em cima das informações que temos aqui. Particularmente acho que esses cinco desafios cobrem muito bem onde a Hapvida está hoje e onde nós queremos chegar em um futuro próximo.

    Em que momento está o programa?
    Anunciamos as startups escolhidas e agora daremos a estruturação dos pilotos. Queremos começá-los em março. Como esse é um programa que não tem uma duração muito longa, a gente precisava de startups um pouco mais maduras, já com fontes de receitas, com uma base de clientes estabelecidas. 

    O sistema Hapvida é muito grande: a gente tem 6,5 milhões de clientes pelo Brasil todo, mais de 35 mil colaboradores, 15 mil médicos, 43 hospitais, 140 clínicas.

    Queríamos, portanto, startups com musculatura para poder atender esse sistema. E, pelo nível delas, acredito que vamos ter muito sucesso com esses pilotos. Agora no começo do ano vamos fazer uma imersão com as startups, ou seja, trazer – entre aspas, porque é virtualmente – as startups para o contexto da Hapvida, para que elas conheçam mais da operação, dos sistemas, do modelo de negócio verticalizado. Então devemos fazer alguns ajustes no produto deles e criar um protótipo para começar o piloto em março. Optamos por fazer esse primeiro programa mais enxuto até para trazer um resultado de uma forma ágil para a Hapvida.

    O que é a healhtech Maida e como ela foi incorporada à Hapvida?
    Ela é o resultado da fusão entre a Haptech, que era o braço de tecnologia do grupo Hapvida que prestava serviços para o mercado, com a Infoway, uma empresa de Teresina, que foi adquirida pelo grupo. 

    O foco da Maida é atuar em inteligência artificial e em telemedicina para a Hapvida. 

    A Maida também tem clientes de mercado, mas faz parte evidentemente do grupo. O ponto principal é usar a inteligência artificial para diagnósticos de exame de imagem, processos de trabalho, uma série de outras situações e também para teleconsulta. Já fizemos mais de 200 mil teleconsultas, muito bem avaliadas pelos pacientes.

    E como a pandemia impactou os negócios da Hapvida? 
    O sistema Hapvida, como um todo, investiu R$ 110 milhões em uma série de ações de prevenção e combate. Além da teleconsulta, essencial nesse processo, montamos um comitê de infectologistas que todo dia discutiu ações, propostas, protocolos de tratamento. Foi um trabalho superintenso para o sistema como um todo. 

    Do ponto de vista da inovação, uma série de ações foram aceleradas.

    O próprio desenvolvimento do produto da teleconsulta foi uma coisa que a pandemia nos demandou e nós respondemos, entregando um serviço de qualidade em tempo recorde. Também fizemos aluguel de hotéis, estoque de suprimentos, uma série de ações para realmente em um momento tão crítico, mantermos a qualidade no atendimento e a proteção à vida, premissas que o sistema Hapvida sempre adotou.

    Várias healthtechs têm surgido nos últimos anos para oferecer opções a planos de saúde tradicionais. Como a Hapvida enxerga essa concorrência pulverizada?
    Estamos sempre muito atentos a essas movimentações, até para entender quando faz sentido fazermos uma parceria com essas healthtechs, quando faz sentido fazer, de repente, um investimento. 

    O que posso garantir em relação ao futuro é que o grupo Hapvida estará sempre olhando e criando soluções inteligentes com o foco na prevenção, na saúde e no bem-estar dos nossos beneficiários. 

    Claro, portanto, que observamos muito as movimentações do mercado, mas o principal ponto é que estamos confortáveis com nosso posicionamento, confortáveis em saber que estamos trabalhando, evoluindo, ajudando a transformar a saúde no Brasil.

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