• Condição rara de pele mobiliza expedição de dermatologistas para Goiás

    Sulamita Chaibub, médica dermatologista e coordenadora voluntária da expedição para tratamento de Xeroderma Pigmentoso em Araras (GO). (Foto: Divulgação)
    Sulamita Chaibub, médica dermatologista e coordenadora voluntária da expedição para tratamento de Xeroderma Pigmentoso em Araras (GO). (Foto: Divulgação)
    Future Health | 29 set 2025

    “Quando descobri o Xeroderma Pigmentoso, ainda na infância, os médicos disseram que eu viveria até os 7 anos de idade. Neste ano completo 31, então para mim, isso é uma vitória e tanto. Para quem tinha uma expectativa de vida tão baixa, me sinto muito grato”, diz Julimar Flôres, um dos pacientes atendidos pela Expedição Recanto das Araras. Presente desde a primeira edição, em 2015, ele celebra não só a própria trajetória de superação, mas também as conquistas que a comunidade vivenciou ao longo dos últimos 10 anos.  

    Promovida pela Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD), em parceria com a La Roche Posay e com o apoio da SAS Brasil – organização leva saúde especializada a populações em situação de vulnerabilidade –, a iniciativa realiza o diagnóstico precoce, o acesso a cirurgias e a transformação da qualidade de vida de uma comunidade inteira afetada pelo Xeroderma Pigmentoso (XP), uma condição genética rara que torna a pele extremamente sensível à luz solar e aumenta em até mil vezes o risco de câncer de pele.

    Com uma taxa inédita de incidência no mundo, um caso para cada 40 habitantes, segundo a Associação Brasileira de Xeroderma Pigmentoso (AbraXP), Araras, localizada no município de Faina (GO), é considerada a maior comunidade com XP do planeta, atraindo o olhar de médicos e pesquisadores do Brasil e do exterior.

    Embora seja uma condição rara, o XP pode ocorrer em qualquer pessoa, independentemente de sexo ou etnia. A proteção solar precisa ser contínua e rigorosa, combinando filtros solares de alta eficácia, barreiras físicas (chapéus, roupas, óculos) e, quando necessário, intervenções médicas para remoção de lesões.

    Desde 2015, quando foi realizada a primeira edição da expedição, centenas de lesões cancerígenas foram removidas, casos foram identificados precocemente e os pacientes passaram a ter acompanhamento regular.

    “A cada dois anos, dermatologistas voluntários de diversos estados se deslocam até a comunidade, levando não apenas conhecimento técnico e equipamentos de ponta, mas também empatia, acolhimento e esperança”, diz o presidente da SBD, Dr. Carlos Barcaui, que participa da ação.

    A edição de 2025, realizada em setembro, conta com um centro cirúrgico montado no próprio povoado, consultórios móveis, exames de imagem, além da distribuição de roupas de proteção e protetores solares da La Roche-Posay (linha Anthelios UVmune KA+ FPS 99), desenvolvidos especialmente para peles sensíveis e com alta proteção contra os raios UVA. A entrega gratuita dos produtos será realizada em sinergia com as orientações médicas e o trabalho educativo conduzido em parceria com a SAS Brasil. 

    De atendimento emergencial ao impacto estrutural  

    Ao longo dos 10 anos, a expedição evoluiu de uma ação médica pontual para um movimento contínuo de transformação social. O envolvimento de parceiros permitiu ampliar o impacto da iniciativa para além da saúde: foram doadas centenas de cestas básicas, roupas especiais e insumos essenciais para as famílias, muitas delas sem acesso a trabalho formal ou serviços públicos básicos.  

    Um dos resultados mais expressivos foi a construção de 50 moradias destinadas a pacientes com XP e suas famílias, concluída recentemente após uma década de articulações e mobilização. Outro avanço importante é a retomada da obra da Unidade Básica de Saúde (UBS) local, prometida desde 2014 e finalmente viabilizada com apoio de programas federais, graças à visibilidade gerada pelo projeto.  

    “Cada edição é uma chance de dar voz a uma comunidade invisibilizada. Graças à visibilidade conquistada, conseguimos abrir portas e conquistar melhorias que antes pareciam impossíveis”, afirma Gleice Machado, secretária de saúde de Faina e mãe de um paciente com XP.  

    Além disso, ações de educação ambiental transformaram a paisagem local, com o plantio de árvores e criação de espaços sombreados, ajudando a criar um ambiente mais seguro para quem vive sob risco constante ao sol. 

    Uma história que nasceu do olhar atento de uma médica   

    A origem da expedição remonta a 2009, quando a dermatologista Sulamita Chaibub atendeu uma criança com sinais levemente suspeitos. Depois de alguns meses, um exame de biópsia confirmou tratar-se de um tumor maligno. Com o  diagnóstico de XP e a descoberta de outros casos semelhantes na região, ela iniciou um trabalho de vigilância ativa em Araras. A situação sensibilizou a comunidade médica e resultou na organização da primeira expedição em 2015. Desde então, Dra. Sulamita continua atuando como coordenadora voluntária do projeto. 

    “Hoje, somos melhores do que ontem, e amanhã seremos melhores do que hoje. Com união, ciência e humanidade, estamos construindo uma nova história para Araras. Uma onda do bem por múltiplas mãos”, afirma a médica dermatologista.

    Ação de 2025

    A expedição deste ano conta com treze especialistas, incluindo Dr. Carlos Barcaui, além de médicos do Rio de Janeiro, Piauí e Goiás. Eles realizam cirurgias, aplicam terapias tópicas, fazem exames de imagem com dermatoscópios digitais e orientam os moradores sobre a importância da proteção solar diária e uso de barreiras físicas como roupas especiais, bonés e óculos escuros.  

    “Estamos diante de um cenário onde a genética, o contexto social e a exclusão se encontram. Em Araras, a situação exige diagnóstico precoce e intervenções rápidas, portanto, nossa missão é ir além dos consultórios e levar a medicina onde os pacientes têm pouco ou nenhum acesso a especialistas”, explica Barcaui.  

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