• “Somos centenários, mas com visão moderna e empreendedora”, diz CEO do Grupo São Cristóvão Saúde

    Valdir Pereira Ventura, o CEO do Grupo São Cristóvão Saúde
    Jose Renato Junior | 28 set 2021

    Uma agulha e alguma quantidade de sangue foram os responsáveis por Valdir Pereira Ventura fazer engenharia. Neto do português José Augusto Ventura, presidente nos anos 1960, e do administrador Américo Ventura, à frente do Grupo São Cristóvão Saúde por 30 anos, Valdir até cogitou ser médico.

    Mas, ao acompanhar a mãe em um procedimento de desentupimento do canal lacrimal, desmaiou. Foi quando decidiu que seguiria por outro caminho.

    Fez engenharia e uma carreira de sucesso na indústria automobilística Ford Motors, onde entrou como estagiário e chegou a diretor. Depois de 32 anos, em 2007, recebeu o convite para assumir o cargo que fora de seu pai dez anos antes.

    Nascido e criado na Mooca, zona leste de São Paulo, onde o pai ergueu o Hospital São Cristóvão, Valdir conduziu uma transformação no Grupo, que opera em modelo verticalizado. 

    A bem da verdade, desde sempre: o grupo nasceu, há 110 anos, quando os motoristas de praça paulistanos, preocupados com os vários acidentes entre seus carros e os bondes no maluco trânsito da cidade que crescia, criaram a Sociedade Internacional Beneficente dos Chauffers do Estado de São Paulo.

    A princípio, ela pretendia defender os interesses da classe e contava com representação jurídica. Com o tempo, ampliou seus serviços para a assistência médica. Só mais tarde é que veio o hospital.

    Nesta entrevista, ele conta sobre a expansão do grupo, analisa o atual cenário de transformação das grandes redes hospitalares, explica como seu negócio atravessou a pandemia e também como foi passar sete dias internado com Covid-19. 

    “Posso garantir que a doença abala mais a mente do que o corpo”, diz ele. “E posso te afirmar que é impossível sair o mesmo depois dessa experiência.”

    O Grupo São Cristóvão Saúde vem passando por uma grande modernização e expansão em sua estrutura física e tecnológica. O que você destaca como os principais marcos?
    Vislumbramos sempre o futuro e a expansão da rede própria, e dessa forma o grupo adquiriu inúmeros imóveis na região da Mooca e adjacências [zona leste de São Paulo]. Juntamente com todas as aquisições, posses e investimentos já realizados, o Grupo São Cristóvão Saúde hoje incorpora 25.000 m² ao seu cabedal de bens patrimoniais. Com relação à expansão tecnológica, somos centenários, mas com visão moderna e empreendedora. 

    O foco da organização hoje é a ampliação dos investimentos em tecnologia, automação de processos, analytics e interoperabilidade, não apenas para continuar ganhando mercado, mas também para fortalecer o relacionamento com nossos beneficiários. 

    Buscamos o constante investimento no parque tecnológico, tanto operacional em saúde quanto em suporte à operação. A exemplo do que estou dizendo, estamos em vias de fechar parceria com o renomado Grupo CDB-Medicina Diagnóstica para aquisição de equipamento de ressonância magnética, adquirimos novas tecnologias para procedimentos e diagnóstico oftalmológico, inauguramos o completíssimo Centro Endogástrico Américo Ventura, o Cegav, instituímos a telemedicina, além de muitas outras ações. Para dar suporte aos processos e à operação, investimos fortemente em venda online, CRM, chatbot, análises preditivas de pacientes crônicos, dispensário eletrônico, ferramentas de BI e de automação de processos.

    Como é a estrutura e a cultura de inovação dentro da empresa?Trabalhamos fortemente a nossa cultura organizacional para caminharmos junto com a cultura de inovação e com as mudanças e inovações que o mercado da saúde nos impõe. Buscamos o fortalecimento dos processos assistenciais, dos processos operacionais, nas estruturas que suportam a otimização das atividades, na utilização de ferramentas como para gestão assistencial, na reestruturação de setores contemplando pessoas focadas na experiência e segurança dos pacientes e no fortalecimento da cultura de centralização da visão do cliente.

    E como você analisa esse cenário atual de constantes movimentações dos grandes grupos hospitalares, com fusões e investimentos polpudos?
    O mercado de saúde tem passado nos últimos anos por importantes transformações, principalmente no que tange ao modelo de negócio, com as recentes consolidações e investimentos no setor. Considerando a mudança no perfil e no comportamento dos consumidores, no que diz respeito à prestação de cuidados e serviços de saúde, o modelo de negócio da saúde, que estava focado na prática curativa, iniciou o movimento de busca à prevenção, orientação, bem-estar e qualidade de vida. 

    Como muitos não estavam preparados para essa mudança de paradigma, novos players surgiram, deflagrando um processo de consolidação de mercado, aumento das operações de fusões e aquisições.

    O mercado expandiu tão rapidamente que se apontou uma tendência a tornar os custos relativos à assistência mais acessíveis. Nesse contexto, há um grande nicho a ser explorado por novos players e grandes grupos, tais como hospitais, laboratórios, clínicas e grandes operadoras de saúde. A pandemia também intensificou esse crescimento e impactou o mercado de fusões e aquisições no setor, pois diversos serviços de saúde migraram para ambientes digitais, consultas a distância, telemedicina, e monitoramento da saúde. Houve uma busca intensa por novos negócios e novos investimentos.

    Mas além do que podemos falar sobre operações de fusões e aquisições, todos estão igualmente interessados e envolvidos na verticalização dos serviços de saúde.

    Esse fenômeno iniciou-se no ano 2000 e se constitui, basicamente, na aquisição, por parte das operadoras de planos de saúde, de sua própria rede de hospitais, centros ambulatoriais, laboratórios e clínicas. Acredito no modelo verticalizado, pois ele permite a gestão da carteira de serviços, controle apurado dos custos, aferição da qualidade dos serviços prestados e aumento da competitividade no setor. Estamos sempre antenados aos cenários de mudança do mercado e sempre prontos às tendências que nos garantem permanência e sucesso nesse competitivo mercado.

    De que forma vocês transformaram o plano de saúde do Grupo São Cristóvão Saúde?
    Quando cheguei em julho de 2007, a carteira de beneficiários era bastante diminuta, com apenas 39 mil vidas. Contamos com arrojo comercial e empreendedorismo e concebemos 50 novos produtos de plano de saúde, para dar alcance e assistência médica aos que buscam uma medicina acessível e de excelência em qualidade. Hoje, o Plano São Cristóvão Saúde conta com quase 160 mil beneficiários e uma carteira rejuvenescida com média de idade de 33 anos, contra a média anterior, que era de 62 anos de idade.

    O IEP Dona Cica

    Por que decidiu criar o Instituto de Ensino e Pesquisa Maria Patrocínia Pereira Ventura – IEP Dona Cica? Quais os objetivos? 
    A multiplicidade de profissionais e a complexidade de decisões que compõem o setor de saúde exigiram grande aprendizado por parte da Instituição. O Instituto de Ensino e Pesquisa – IEP Dona Cica – é responsável por diversos cursos de capacitação e atualização na área da saúde e administrativa, pós-graduação em fisioterapia e uroginecologia, projeto trainee para a enfermagem, residências médicas, com destaque para a especialidade de mastologia, cirurgia geral e cirurgia plástica, grupos de estudos técnico-científicos, além de palestras ministradas ao longo do ano voltadas à comunidade.

    Grandes parceiros também agregaram valor na busca pelo conhecimento, como a FGV para a realização do MBA in company e o Instituto Albert Einstein para o aprimoramento do corpo de enfermagem.

    Hoje, temos investido muito nas plataformas digitais para os encontros que promovem qualificação e capacitação de nossos colaboradores. A adesão é altíssima, pois o futuro é digital. O IEP Dona Cica é um grande fomentador de cultura.

    Valdir, você fez carreira na Ford, onde trabalhou por mais de 30 anos. Como se deu a transição da indústria automobilística para a de saúde? 
    Minha formação acadêmica é a engenharia. Entrei na multinacional automobilística Ford Company Brasil como estagiário e fui paulatinamente galgando os degraus: depois como trainee, engenheiro, gerente de departamento de área e finalmente diretor de linha veicular. Foram 32 anos de uma feliz e orgulhosa trajetória. Assumi a presidência do Grupo São Cristóvão Saúde em julho de 2007. A entidade, que este ano completará em dezembro 110 de existência, foi dirigida inicialmente por meu avô e depois, por longos anos, por meu pai, o administrador sr. Américo Ventura. Então, tenho vínculos muito fortes com a instituição.

    Na prática, como a pandemia afetou a rotina do Grupo São Cristóvão Saúde e também seus planos?
    Quando a pandemia se instalou e houve aumento alarmante de casos no Estado de São Paulo, o Grupo São Cristóvão Saúde reforçou fortemente as medidas que visavam aumentar a segurança de seus beneficiários, colaboradores e comunidade, além de propagar continuamente as recomendações da OMS quanto às medidas de higiene, assepsia das mãos, uso de máscaras e restrição do contato social ou trânsito de pessoas em ambientes de grandes aglomerações, evitando a transmissão comunitária do vírus. Para que a estratégia ao enfrentamento da pandemia fosse bem discutida e bem fundamentada, legitimamos o Comitê de Crise.

    O Comitê, composto pela alta direção, médicos infectologistas e outros de diferentes especialidades, foi o responsável pelos disparos diários de diversas ações.

    Entre essas ações, a instalação de cabines de desinfecção para os colaboradores, definição de diversos protocolos e treinamento contínuo das equipes multiprofissionais, acolhimento dos profissionais de linha de frente, inclusive com apoio psicoterapêutico, realocação do Pronto-Socorro Geral a fim de separar casos suspeitos de Covid-19 de outras enfermidades, contratação emergencial maciça de profissionais de linha de frente para enfrentamento da demanda projetada, dentre outras operações. Investimos também na medicina digital e telemedicina, para dar suporte aos nossos beneficiários.

    Acreditamos que informação é a melhor vacina a ser disponibilizada para a guerra que ainda estamos vivendo, e para isso divulgamos diariamente boletins sobre todos os dados de nosso hospital. 

    Também criamos a FAQ sobre a doença e suas manifestações e um site específico que concentra as ações realizadas na instituição na luta contra a Covid-19. Estabelecemos uma rede de divulgação e propagação das notícias e medidas a serem tomadas, sempre seguindo as diretrizes da OMS e do Ministério da Saúde, por meio de vídeos educativos, mensagens encorajadoras e acima de tudo muita humanização e acolhimento a toda a família São Cristóvão.

    E a você, pessoalmente, como foi lidar com a maior pandemia do século no hospital?
    No dia 23 de março, após o governo e prefeitura de São Paulo decretarem quarentena, entrei em casa e não saí mais. Não só obedeci às determinações impostas, como estabeleci que todos os colaboradores do Grupo São Cristóvão Saúde que se encontravam em situação de risco, como grávidas, idosos, pessoas com comorbidades e afecções respiratórias, ficassem em casa também, exercendo suas funções em regime de home office

    Achei que estava blindado, mas, em agosto de 2020, após cinco meses de clausura, o vírus me encontrou. 

    Até hoje, repasso toda a rotina vivida na tentativa de identificar por onde ele teria entrado, e não consigo ver onde foi a brecha. Seis dias depois do diagnóstico, o ar me faltou de maneira mais angustiante, e veio a febre, não muito alta, mas recorrente e resistente aos medicamentos. Por prudência e monitoramento, os médicos decidiram pela minha internação. Foram 7 dias de hospitalização. Muita provação, muita resiliência, exercício da fé e uma série de incertezas. Posso garantir que a doença abala mais a mente do que o corpo. Fui melhorando aos poucos, até estar seguro de que poderia me recuperar em casa. E posso te afirmar que é impossível sair o mesmo depois dessa experiência.

    Que aprendizados, no que diz respeito ao negócio e também pessoalmente, você tirou disso tudo?
    Aprendemos e compartilhamos diariamente com todos que, embora não seja possível deixar de lado as entregas, os resultados e os desafios profissionais, acima de tudo devemos ter sempre uma visão positiva do futuro, apesar do já longo período de enfrentamento ao vírus e vivenciamento da grave crise sanitária. Vivemos um enorme aprendizado e muitos ganhos quando trabalhamos em equipe. Nesse período, não houve nenhuma demissão ou redução de carga horária com consequente redução de salário. Ao contrário, frente à demanda surgida, contratamos mais de 200 novos colaboradores. Ao espalhar empatia, solidariedade, compaixão e cuidado consigo e com o próximo abraçamos uma verdade: nossos colaboradores são a chave do nosso sucesso.

    Um dos oito centros ambulatoriais do Grupo

    Você já está há quase 14 anos à frente do Grupo São Cristóvão Saúde. Quando olha para trás, o que faria diferente e o que mais dá orgulho? 
    Não faria nada diferente. As decisões tomadas, certas ou erradas, consideraram sempre o cenário vivido à época. O que de certa forma não saiu da maneira esperada serviu de aprendizado para novas decisões. Tenho muito orgulho do patrimônio que construímos nos últimos 14 anos. Temos 10 unidades de negócio. Nossa carteira de beneficiários do plano de saúde tem hoje quase 160 mil vidas, que utilizam as modernas e adequadas instalações da instituição, sem contar a ampla rede credenciada por diversos municípios do estado de São Paulo. 

    Ampliamos sobremaneira o número de leitos do Hospital e Maternidade São Cristóvão, passando de 169 anteriormente, para 275 atualmente. Em dezembro chegaremos à marca de 300 leitos. 

    Temos oito Centros Ambulatoriais próprios especializados, e um Centro de Atenção Integral à Saúde [Cais], especializado em promoção e reabilitação à saúde, ao passo que as atividades acadêmicas e de capacitação profissional ficam sob responsabilidade do IEP Dona Cica. Somam-se ainda os modernos e bem equipados Centro Cardiológico, Centro Endogástrico [Cegav] e o Centro Laboratorial [CLAV]. Nossa filantropia é a nossa missão e identidade do Grupo São Cristóvão Saúde.

    Hoje, estamos em diversos municípios paulistas cooperando com as ações do sistema público de saúde por meio dos atendimentos médicos-ambulatoriais. 

    Somos provedores da Santa Casa de Misericórdia de Francisco Morato [Grande São Paulo], onde também sou presidente. E, por fim, também como unidade de negócio, temos um hotel em Campos do Jordão, o Recanto São Cristóvão. Conquistamos inúmeras acreditações (e reacreditações) de qualidade, tais como ONA III, ISO 9001, Prêmio de Responsabilidade Socioambiental Chico Mendes, Selo Ouro SINASC e outros prêmios de reconhecimento nacional e internacional. A instituição foi acreditada em julho de 2019 pela canadense Qmemtum, mérito que somente os melhores hospitais de São Paulo possuem. Orgulho mesmo é saber que pude contribuir de corpo e alma para que o Grupo São Cristóvão Saúde cresça cada vez mais, engajado na fiel missão de promover a excelência na saúde.

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