• “O câncer de próstata é o mais comum entre os homens depois do câncer de pele”, alerta especialista

    Nilo Jorge Leão - uro-oncologista
    Nilo Jorge Leão é uro-oncologista, chefe de urologia no hospital Mater Dei em Salvador (BA), e coordenador do Instituto Baiano de Cirurgia Robótica. (Foto: Divulgação)
    Jose Renato Junior | 17 nov 2022

    Este mês, na saúde, é dedicado à campanha do Novembro Azul, que traz conscientização acerca do câncer de próstata, doença que acomete um em cada oito homens. É preciso falar mais sobre essa doença, que ainda é tabu para muitos homens. 

    A próstata é uma glândula presente somente no sistema genital masculino, localizada na frente do reto e embaixo da bexiga urinária. Ela tem a função de produzir o fluido que protege e nutre os espermatozoides no sêmen, deixando-o mais aquoso. Atrás dela, encontram-se glândulas conhecidas como vesículas seminais, responsáveis por produzir a maior parte do líquido para o sêmen.

    Assim como todos os nossos órgãos e tecidos, a próstata tem células que estão em constante reprodução, nascendo e se degenerando para que novas possam surgir. O câncer, de maneira geral, é como um “erro” nesse processo, uma produção de células de maneira desordenada e com capacidade de se disseminar para outros órgãos (metástase).

    Nilo Jorge Leão, uro-oncologista e chefe do serviço de urologia do hospital Mater Dei, em Salvador (BA), detalha: 

    “Quando entramos no debate do que é um tumor benigno e um maligno, a diferença básica é a capacidade que o tumor maligno tem de se disseminar para outros órgãos.”

    Números alarmantes

    O câncer de próstata causou 47 mil óbitos entre 2019 e 2021 no Brasil, de acordo com o Sistema de Informação sobre Mortalidade do Ministério da Saúde – uma média de 64 mortes por dia.

    De acordo com o Instituto Nacional do Câncer (Inca), eram esperados 65.840 novos casos para este ano. Outro indicador do Ministério da Saúde mostra o impacto da doença no país. Em 2020, foram registradas 31.888 biópsias, em 2021, 34.673, e até agosto deste ano, mais de 27 mil. 

    “O câncer de próstata é o mais comum na população masculina depois do câncer de pele. São cerca de 70 mil novos casos por ano e os principais fatores de risco são o sedentarismo, a obesidade, a história familiar de câncer em parentes de primeiro grau – como pais e irmãos – e a etnia negra”, explica Nilo.

    Apesar dos números e de sua alta incidência, o câncer de próstata não é um mais severos. Isso porque ele se apresenta de maneiras variadas, desde tumores leves até mais agressivos.  

    Como não há prevenção para esse tipo de câncer, a campanha Novembro Azul surgiu para estimular o diagnóstico precoce. E qual é a diferença entre ambos? 

    “Prevenção é tomar uma atitude para evitar que o câncer surja. Não fumar previne a ocorrência de câncer de pulmão, por exemplo. No de próstata, não há uma medida específica para isso. Sabemos que bons hábitos de vida ajudam a prevenir todo tipo de câncer, mas o mais importante é chamar a atenção da população masculina para a importância do diagnóstico precoce”, detalha Nilo. 

    Quando diagnosticado na sua fase mais inicial, o câncer de próstata possibilita a cura em mais de 95% dos pacientes e com uma menor incidência de sequelas, ou seja, menor risco de impotência e de incontinência urinária. Mas só há diagnóstico precoce em quem tem seus exames de rotina em dia, afinal, esse tipo de tumor é silencioso – não apresenta sintomas até a fase de metástase. 

    “Tem homens que acham que estão com alguma alteração para urinar e acham que é câncer de próstata, mas não é. Geralmente quem causa alteração para urinar são doenças benignas da próstata. Esse câncer é sorrateiro, se ele causar perda de peso, anemia, é porque já deu metástase, o que já o classifica como incurável”, pontua Leão.

    Rastreio e condutas

    No caso do câncer de próstata, o rastreio (ou screening) é feito por meio de exame de toque, periodicamente, e pelo exame de sangue, conhecido como PSA. 

    A Sociedade Brasileira de Urologia recomenda que todo homem a partir dos 50 anos de idade realize esses exames de rastreio e, caso sejam obesos, negros ou tenham histórico familiar, devem começar a partir dos 45 anos de idade. 

    “Caso o toque ou o PSA estejam alterados, pedimos um outro exame: a ressonância multiparamétrica da próstata. Esse escaneamento nos permite descobrir aqueles cânceres com maior potencial de agressividade e direcionar a biópsia, que é o exame que de fato vai dar o diagnóstico de câncer de próstata”, diz o urologista, que também é coordenador do Instituto Baiano de Cirurgia Robótica.

    A partir do diagnóstico, esse tumor será dividido em três grupos: os de baixo risco, os de risco intermediário e os de alto risco. Só é considerado alto risco aquele câncer que tem chance de progredir e sair da próstata, migrando para os ossos e outros órgãos e podendo levar o paciente a óbito. 

    Quando o caso é de baixo risco, o chamado câncer indolente – que tem um crescimento progressivo lento, sem grandes chances de evolução, sobretudo se o paciente tiver poucos anos de vida pela frente – há três opções de tratamento disponíveis. 

    São elas: cirurgia, radioterapia ou o protocolo de vigilância ativa. “Nesse caso, vamos realizar ressonância a cada 6 meses, PSA e toque retal a cada 4 meses e vamos fazer uma biópsia por ano. Se não estiver progredindo, seguimos observando sem precisar tratar. Mas às vezes é difícil para o paciente entender que ele não vai fazer nenhum tratamento, somente observar”, comenta. 

    Para os grupos de risco intermediário e alto, é necessário um tratamento ativo. A primeira opção de tratamento, chamada de padrão ouro, é a prostatectomia radical, que é a remoção radical da próstata e das vesículas seminais. Essa cirurgia é feita classicamente de forma aberta, ou seja, através de um corte de 25 a 30 cm.

    Outra opção é a laparoscopia, que é um processo menos invasivo e com menor risco de sangramento, mas que é longo e limita os movimentos dos cirurgiões por causa da visão 2D.

    Tecnologia de ponta

    A evolução mais recente na intervenção cirúrgica sobre o câncer de próstata veio com robôs inseridos no paciente e controlados pelos cirurgiões. 

    “O robô permite que a gente enxergue em 3D, com ampliação de imagem em até 10x e um filtro de tremor, ou seja, quando fazemos um movimento, ele evita que haja um tremor na execução do mesmo dentro da barriga do paciente”, conta Nilo. 

    A cirurgia passou a ser mais rápida e precisa, durando entre 60 e 90 minutos. Assim, o paciente tem alta em menos de 24h e se recupera mais rápido, podendo voltar a trabalhar em 1 semana e a praticar atividades físicas em 2 a 4 semanas.

    O uso de robôs também reduz o risco de impotência sexual e de incontinência urinária. A radioterapia é recomendada para os casos em que o paciente não tem condição de fazer a cirurgia, seja por alguma outra doença grave seja por reincidência do câncer. 

    Há também aqueles pacientes que nunca foram ao urologista, não fazem acompanhamento, e que descobrem o câncer já em fase avançada, quando ele já se espalhou para os ossos e outros órgãos. Embora esses casos sejam incuráveis, há uma série de medicações modernas disponíveis que podem ser utilizadas para prolongar a vida desses pacientes. 

    “Substâncias como abiraterona, enzalutamida e apalutamida são exemplos de medicações mais novas que têm prolongado a vida dos pacientes com câncer de próstata avançado”, lista Nino. 

    “O câncer de próstata, quando está ativo, se alimenta da testosterona. Essas medicações todas agem zerando a testosterona no corpo. Com isso, é como se faltasse combustível para a doença avançar”, explica o especialista.

    Essa é a chamada hormonioterapia e, apesar de seus claros benefícios, o tratamento pode acabar com a libido, causar impotência, osteoporose e indisposição. Ou seja, ela prolonga a vida do paciente, mas às custas de efeitos colaterais – mais um fator que destaca a importância de descobrir esse câncer o quanto antes. 

    “Na rede pública, pelo menos 30% dos homens são diagnosticados com câncer de próstata já com metástase, o que é uma verdadeira tragédia. Isso acontece porque o paciente tem dificuldade de acesso a políticas de rastreio”, lamenta.

    Os locais mais comuns de metástases do câncer de próstata são os gânglios e os ossos próximos, como a coluna, fêmur, bacia. Todos esses tumores secundários serão tratados com base no primário, ou seja, se o primeiro câncer for o de próstata e, a partir dele surgiram outros, é a partir do primeiro que a conduta será definida. 

    Um recurso interessante para famílias que apresentam muitos casos de câncer de próstata é a possibilidade de avaliar se existe alguma mutação gênica no sangue desses homens com grau de parentesco próximo. Isso possibilita saber se o indivíduo tem chance mais alta de desenvolver câncer de próstata”, diz Nilo.

    Em todos os casos, o especialista reforça que o mais importante é estar atento, porque se descoberto ainda cedo, o câncer de próstata apresenta chances altas de sucesso para a cura. 

    “O Novembro Azul é muito mais abrangente do que o câncer de próstata. É um trabalho de conscientização para que o homem frequente o médico e realize outros exames de rotina, converse sobre sua sexualidade e cuide da saúde de forma geral”, conclui.

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