Outubro começou e, com ele, uma das campanhas mais tradicionais de promoção da saúde: o Outubro Rosa. Com o objetivo de gerar conscientização acerca do câncer de mama, um dos mais frequentes entre mulheres, a campanha é internacional e surgiu ainda nos anos 1990, nos Estados Unidos.
Aqui no Brasil, as primeiras movimentações sobre Outubro Rosa ocorreram em 2002, mas o movimento só ganhou força em 2008. Foram estimados 66.280 casos novos de câncer de mama em 2021, com um risco estimado de 61,61 casos a cada 100 mil mulheres. Mas afinal, do que se trata o câncer de mama? Quais são os seus caminhos de diagnóstico e cura? Conversamos com André Mattar, médico mastologista no Grupo Oncoclínicas e diretor de oncologia no Hospital Pérola Byington. Confira a seguir:
ANDRÉ MATTAR: É importante dizer que o câncer de mama é um dos mais frequentes na mulher – hoje é o segundo, somente atrás do câncer de pele. Ele é multifatorial, então diferente de um câncer como o do colo do útero, por exemplo, que pode ser relacionado com o HPV, o câncer de mama tem vários fatores associados à sua causa: histórico familiar, hábitos, obesidade e estresse.
A pessoa que vive desregradamente tem mais chances de desenvolver câncer de mama do que a que se cuida mais.
AM: A maior parte das pessoas que fazem exame de diagnóstico vão encontrar o tumor antes de ter algum sintoma, já que muitas vezes ele não se apresenta. Já as pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS), com menos acesso a exames, acabam diagnosticando a doença a partir de um nódulo palpável pelo autoexame.
É importante diferenciar o câncer subclínico – que aparece antes de se sentir qualquer coisa – do câncer com sintoma. Este é muito mais frequente em mulheres depois da menopausa.
Quanto maior a idade, maior o risco. O que é raro antes dos 50 passa a ser um risco aumentado a partir dos 80. É importante falar isso porque muitas vezes a pessoa pensa “nossa ela já tinha tanta idade, não tem mais risco de ter câncer de mama”, e é justamente o contrário.
AM: Não sabemos exatamente, mas todo dia produzimos câncer e nosso sistema imune, atento, identifica a célula alterada e ataca. Quando temos uma falha desse mecanismo de defesa, a célula cancerígena começa a proliferar sem controle.
Conforme ele vai crescendo, tem potencial de se espalhar pelo corpo, o que chamamos de metástase. Nestes casos, por que é importante identificar a origem do câncer? Porque o tratamento é baseado na localização inicial. Se ele alcançou o fígado, vamos tratar como um câncer de mama que foi para o fígado, com medicações específicas da mama.
AM: Quando temos o diagnóstico, em busca de saber se o câncer é mais ou menos agressivo, é que a primeira conduta pode ser tomada. Começa com uma cirurgia ou com tratamento para diminuir o tumor e as chances dele ir para outros órgãos, que é a quimioterapia ou a hormonioterapia.
Dependendo do tamanho do tumor e do grau de comprometimento da mama e dos linfonodos, definimos o estágio da doença. Juntamente com a biópsia, que fornece informações importantes sobre o tumor, a determinação do estágio define o momento de iniciar o tratamento e os rumos que ele deve tomar.
AM: Se a pessoa tem histórico familiar importante, tem que tomar mais cuidado. O que para o médico é importante: mãe, irmã, filha ou pai com câncer de mama – familiares que não sejam de primeiro grau não são tão determinantes.
Observar se esses familiares apresentaram o câncer antes da menopausa, pois quanto mais cedo ele aparece em familiares, maior o risco para o indivíduo.
O sintoma que deixa os médicos preocupados são nódulos endurecidos palpáveis na mama que não somem depois da menstruação.
Se a pessoa apalpa o nódulo, ele é duro, e depois de menstruar ele continua lá, é importante ela buscar ajuda porque pode ser um sinal de um câncer de mama.
Existem outras alterações que ligam um alerta para que o tumor seja investigado na mama, como coloração da pele, que às vezes fica vermelha, e saída de secreção sanguinolenta pelo mamilo. Porém, como a maior parte dos cânceres é assintomática, é preciso fazer exames de rastreio.
Hoje, o único exame que diminuiu a mortalidade do câncer de mama é a mamografia. É um exame antigo, incômodo, mas, comparando um grupo que faz a mamografia com um grupo que não faz, há menos mortes no grupo que foi examinado. É difícil desbancar um resultado assim.
Em pacientes acima dos 40 anos, além de diminuir os riscos da pessoa morrer se tiver a doença, diminui também o risco da cirurgia ser mais mutilante. Fazer exames periódicos e incluir a ressonância magnética é importante, pois ela possibilita mais diagnósticos dos cânceres de mama ao apontar alterações antes do câncer aparecer.
Hoje, existe uma discussão porque o Ministério da Saúde recomenda mamografia a cada dois anos para mulheres na faixa de 50 anos até 69 anos. Sociedades de mastologia, de ginecologia e de radiologia em conjunto, fizeram um documento afirmando ser mais indicado que a mamografia seja anual e a partir dos 40 anos até os 70 anos. Depois disso, o exame só é indicado se a expectativa de vida for de 8 anos ou mais.
Para quem tem antecedentes importantes, o recomendável é examinar dez anos antes da idade em que o tumor apareceu no familiar. Por exemplo, se sua mãe teve câncer de mama com 35, você deveria começar a se examinar aos 25. Se o câncer ocorreu depois da menopausa, Isso é discutível, porque ninguém começa tão cedo assim. Se o parente teve o câncer de mama depois da menopausa, começaríamos os exames aos 35 anos da paciente.
AM: Quando se tinha um câncer de mama antigamente, de qualquer tamanho, a mama inteira era retirada. Hoje, conseguimos tirar só a área do câncer e isso permite que a mama fique esteticamente preservada.
Estudos acompanhando pessoas que fizeram cirurgia de retirada completa da mama com reconstrução versus cirurgias conservadoras, que não retiraram a mama inteira, revelam que a chance de cura é igual nos dois casos.
AM: Em 90% dos casos, não há histórico genético importante. Você olha na família da pessoa e ninguém teve. Se fizer um teste genético, não tem nenhuma mutação que causou aquilo. Mas em 10% tem, e as mais frequentes são a mutação de dois genes que se chamam BRCA 1 e 2.
O que a gente sabe da história da Angelina Jolie, por exemplo, que ganhou notoriedade, é que a mãe dela teve um câncer de mama e testou para essa mutação. Então, a atriz também fez o teste e também teve uma mutação que aumenta o risco individual.
O risco médio é mais ou menos de 12%. Uma a cada 8 mulheres que viveram até os 80 anos podem ter câncer de mama, mas quando existe essa mutação, aumenta para um risco de 60% se ela viver até os 80.
Nesses casos, a indicação é a cirurgia profilática, porque além da mama, essa mutação também traz um risco maior de ter câncer no ovário, e aí ela precisa fazer uma ooforectomia, que é a retirada dos ovários.
AM: Sim, porque a quimioterapia é efetiva, mas meio burra. Ela atua sobre todas as células do organismo que se multiplicam rapidamente, inclusive as do câncer. Ela vai atuar na medula óssea, causando anemia. Nas células dos pelos e dos cabelos. Vai deixar a pessoa com náusea, ânsia de vômito. Portanto, ela é agressiva e não direcionada. Por isso, a ciência tem estudado tipos de quimio mais específicos para cada tipo de tumor.
AM: A gente divide os riscos em dois aspectos: relacionados ao tratamento, então quando a pessoa faz uma quimio ela tem risco até de morrer de problema cardíaco, e com a rádio é a mesma coisa. Hoje, os protocolos são melhores, as marcações evitam que o tratamento irradie para o coração. Mas ainda existe esse risco teórico.
E a gente tem o risco de a pessoa morrer da doença e de a doença voltar. Quanto mais tempo a pessoa vive, mais ela está exposta ao retorno do câncer de mama.
Essa reincidência depende do estágio da doença. Se ela é diagnosticada com tumores ainda pequenos, a chance de a doença voltar é menor do que se o tratamento começar com o câncer num estágio mais avançado.
AM: Sim, mas é raro. A cada 100 diagnósticos em mulheres há um diagnóstico em homens. A chance é reduzida, mas se a pessoa tem um pai que teve câncer de mama, o risco de ela desenvolver uma mutação associada ao câncer de mama é alto.