Trabalhar no metaverso já é um fato para quem atua na área da saúde – este espaço em que a realidade física e a virtual se associam está mudando a prática médica.
Do entendimento de casos complexos por equipes em qualquer lugar do planeta, passando por planejamentos cirúrgicos e chegando até o ensino nas universidades e faculdades, contar com o ambiente virtual é uma ferramenta que amplia os horizontes para profissionais que toparem encarar essa tecnologia como aliada.
É nisso que confia o ginecologista Heron Werner, coordenador do Biodesign Lab da Dasa. O ambiente virtual é uma parceria entre a Dasa, considerada a maior rede de saúde integrada do Brasil, e a PUC-Rio.
O laboratório é focado em pesquisas baseadas na obtenção de imagens de formas não-invasivas por meio de exames, como ultrassonografia, ressonância magnética e tomografia computadorizada. O objetivo é a replicação tridimensional em meio físico, seja com a impressão 3D seja com imagens virtuais para o uso em realidade virtual e mista.
“É uma tecnologia que vem para ficar. O mundo virtual é uma extensão do que vivemos hoje. Vemos isso em várias áreas, inclusive na medicina. Discutir um caso virtualmente, em uma sala, sem deslocar equipe, por exemplo, é um grande avanço”, explica Werner.
O laboratório liderado pelo médico, que atende no Rio de Janeiro, tem sete profissionais fixos trabalhando em atividades multidisciplinares. “Também temos projetos pontuais e parcerias com outras instituições importantes, como o Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA), Laboratório Nacional de Computação Científica (LNCC), Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UniRio)”, conta.
Um dos casos mais emblemáticos que o ginecologista acompanhou – em grande parte por meio do metaverso – foi o dos gêmeos Arthur e Matheus, gerados unidos pelo crânio, numa condição rara conhecida pela medicina como craniopagia.
“Uma situação complexa que foi beneficiada pela tecnologia. Participamos das etapas cirúrgicas, discutindo os procedimentos e reunindo todos os profissionais por meio da realidade imersiva”, descreve o médico.
A operação, bem sucedida, virou referência na América Latina para futuras cirurgias de separação de gêmeos unidos pelo crânio.
No Biodesign Lab, os especialistas criam modelos e imagens realistas, em alta definição, que auxiliam os médicos em estudos e diagnósticos precisos. Semanalmente, a equipe se reúne com profissionais do mundo todo para discutir casos clínicos, fazer simulações e planejar cirurgias personalizadas com o uso da realidade virtual, realidade aumentada e metaverso.
Esta última plataforma tem sido a mais utilizada graças ao custo acessível dos óculos (em torno de R$ 3 mil), e também pela forma mais orgânica que ela oferece para participação nas discussões e interações virtuais.
Para o médico, já é possível usar esta tecnologia em escala, mas o gargalo no momento está na demanda pelos próprios colegas.
“Entendo que há uma certa resistência ao novo, um comodismo em mudar rotinas e não confiar em tecnologia. Mas barreiras que precisam ser vencidas e mesmo os médicos mais conservadores podem se beneficiar com estes modelos de atuação”, provoca.
Além da facilidade de interação, da possibilidade de discutir de maneira prática casos com médicos do mundo todo sem precisar do deslocamento, um outro benefício latente do uso da realidade aumentada se apresenta no ensino médico.
“A mistura de realidades é um avanço fantástico. No meu tempo de estudante, a gente ficava subindo até em banquinhos para acompanhar uma cirurgia. Hoje dá pra participar virtualmente de uma operação, aprender e nem se preocupar com contaminação do campo cirúrgico”.
Outro ponto alto do uso da realidade virtual para quem está em formação são as aulas “práticas”. Por meio de inteligência artificial é possível criar um órgão ou qualquer parte do corpo em 3D e levar os alunos lá para dentro.
“Eu já fiz uma aula dentro de uma tuba uterina, por exemplo. A aula foi uma imersão na estrutura”, conta Werner.
E mais: com um dispositivo em forma de luva com sensores táteis, é possível tocar a imagem e ter a “sensação” física de manuseá-la.
“Isso significa um grande complemento para a prática cirúrgica. Não será mais preciso se deparar com algumas situações somente na mesa de operação, uma vez que podemos acessar as estruturas do paciente de forma consistente antes do procedimento”, afirma Werner.
Por enquanto, o Biodesign Lab está focado em pesquisas, nas discussões de casos e no planejamento de cirurgias. Porém, em um futuro breve, a tecnologia da realidade aumentada deve chegar aos consultórios e permitir que os pacientes se beneficiem dela até mesmo em consultas.
“Medicina fetal, neurologia, cardiologia, ortopedia e transplantes serão áreas que terão avanços significativos com o uso do metaverso. A realidade imersiva será uma aliada para todos os ramos da medicina”, finaliza Werner.