Até pouco mais de um ano atrás, uma pessoa que precisasse passar por uma cirurgia para a implantação de uma próteses, por exemplo, contava unicamente com a habilidade e o senso de orientação espacial tridimensional do médico para o correto alinhamento e posicionamento de ossos e implantes.
Em dezembro de 2020, um robô chegou ao país para auxiliar as cirurgias ortopédicas e deixá-las mais precisas. Embora a cirurgia robótica de forma geral tenha completado 13 anos no país, para a ortopedia ela ainda é novidade.
O procedimento, que começou a ser usado em alguns hospitais privados de São Paulo, Minas Gerais e, mais recentemente, no Sul do país, é realizado em pacientes que tiveram um desgaste muito grave das articulações, a ponto de precisarem substituí-las por próteses.
O robô auxilia o cirurgião a fazer os cortes necessários para a colocação destas articulações artificiais de forma mais precisa e também melhora o posicionamento dos componentes.
“Os cortes de um osso na cirurgia de joelho, por exemplo, dependiam da experiência do médico e da capacidade dele de usar alguns guias e instrumentos”, explica Marco Aurélio Silvério Neves.
Marco é médico ortopedista, traumatologista e um dos pioneiros no Brasil em técnicas avançadas para realização de cirurgias de prótese de quadril e de joelho.
“A robótica acaba agregando precisão para esses procedimentos. No caso da prótese de quadril, a tecnologia facilita o posicionamento dos componentes, garantindo que o cirurgião entregue o melhor resultado possível para o paciente.”
CIRURGIA MAIS PRECISA
Adepto da tecnologia, Marco Aurélio fez especialização em Ortopedia e Traumatologia e em Cirurgia do Quadril e do Joelho pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, onde também é graduado.
Entre as várias certificações que ele tem, consta a de referência em cirurgia de prótese de quadril minimamente invasiva com a técnica AMIS (Cirurgia Minimamente Invasiva) e em cirurgia de prótese de joelho pela Medacta Corporate. Além da cirurgia robótica, Marco também faz uso de realidade aumentada.
Ele explica que nas cirurgias robóticas o robô é a ferramenta, assim como o bisturi. O cirurgião robótico senta-se nos controles e guia os instrumentos cirúrgicos nas extremidades dos braços do robô.
Com essa ajuda do robô, Marco Aurélio conta que o procedimento proporciona maior assertividade, melhor planejamento da cirurgia de forma geral e mais personalização no resultado – e, claro, precisão.
Precisão é algo importante porque estudos mostram taxas de até 30% de implantes imprecisos nas cirurgias convencionais, independentemente da experiência do cirurgião.
Para o paciente, o robô garante menor agressão cirúrgica, o que pode favorecer uma recuperação mais rápida.
“No caso das cirurgias ortopédicas, o paciente passa a andar mais rápido, fica menos tempo com limitação, tem menos sangramento ou complicações pós-operatórias”, diz o cirurgião.
“A agressão da cirurgia acaba sendo um pouco menor, na medida em que ela é menos invasiva, o que favorece uma recuperação mais rápida nessas cirurgias de prótese de quadril e joelho.”
Quando afirma que o procedimento costuma ser minimamente invasivo, o especialista quer dizer que, com pequenas incisões, o robô é capaz de realizar técnicas cirúrgicas complicadas, deixando muito pouco tecido cicatricial.
Já a médio e longo prazos, uma prótese, seja de joelho ou de quadril, bem colocada, vai desempenhar um melhor resultado.
Portanto, o paciente vai poder ter suas atividades normais, eventualmente fazer algum tipo de atividade esportiva de baixo impacto, e ter a sua qualidade de vida restaurada.
“Em última análise, essas próteses, bem colocadas e bem posicionadas para a anatomia de cada paciente, permitem uma maior durabilidade”, acrescenta o ortopedista.
Ainda de acordo com Marco Aurélio, outro aspecto importante das tecnologias dos braços robóticos na ortopedia é que, por elas auxiliarem de forma quase sempre integrada às tomografias, o planejamento pré-operatório se torna mais assertivo para cada paciente.
TECNOLOGIA AINDA TEM CUSTO ELEVADO
Embora seja muito vantajosa tanto para o profissional da saúde quanto para o paciente, a tecnologia ainda é recente e está disponível apenas em alguns hospitais privados de ponta no Sul e Sudeste do Brasil.
O motivo? O custo. Importar um robô desses para cá é caro. Além disso, há os investimentos na manutenção do equipamento e no treinamento dos médicos para operá-lo.
Para o sistema público adotar algumas tecnologias deste porte é necessário comprovar que esses investimentos trazem um benefício em larga escala.
“Esses tipos de análise e de dados ainda estão sendo construídos e, na realidade do Brasil, vão precisar de algumas adaptações para entendermos exatamente como um investimento desse pode beneficiar o todo”, argumenta Marco.
Já no mercado privado, há uma tendência de a robótica ser um pouco mais acessível num prazo curto de tempo. “Mas não sabemos, e eu não poderia dizer, se todos os hospitais privados vão seguir por esse caminho”, afirma o especialista.
COMO É UM ROBÔ DE CIRURGIA ORTOPÉDICA
O primeiro robô a chegar ao país para cirurgias ortopédicas é o Rosa System, desenvolvido pela multinacional americana Zimmer Biomet.
O Rosa (acrônimo de Robotic Surgery Assistant) é colaborativo – ou seja, auxilia o médico – e é composto por uma plataforma robótica, com ferramentas de planejamento pré-operatório 3D.
Além dessas informações, ela armazena dados intraoperatórios em tempo real sobre tecidos moles e anatomia óssea, projetada para facilitar a precisão do corte ósseo e a análise de amplitude de movimento.
Embora o custo ainda seja um impeditivo para a ampla adoção da tecnologia, as cirurgias com robôs devem tornar-se cada vez mais comuns.
“Além de aumentar a precisão dos procedimentos que realizamos, esse tipo de procedimento tem o potencial de uniformizar os resultados, fazendo assim com que seja muito menos dependente do brilhantismo ou das capacidades técnicas de um determinado cirurgião”, acredita o médico.
“Se mais pacientes conseguirem fazer uma cirurgia de prótese de quadril ou joelho bem alinhada, com os componentes dos implantes bem posicionados, mais pessoas terão melhores resultados e menos complicações”, acrescenta.
“Por isso, eu acredito que essas tecnologias tenham um grande e possível potencial de crescimento para o futuro.”